
Vaivém
Belo Horizonte
CCBB BH
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Apresentação
Conhecemos bem a sensação de deitar em uma rede de dormir: enquanto nos ajeitamos em sua estrutura mole, ela nos acolhe. E, à medida que o corpo se instala, a rede se movimenta, embalando-nos com seu vaivém característico. Como e quando essa sensação de acolhimento se tornou sinônimo de pertencimento identitário? Longe de reforçar os estereótipos da tropicalidade, esta exposição investiga suas origens: ao revisitar o passado, conseguimos compreender como um fazer ancestral criado pelos povos ameríndios foi apropriado pelos europeus e, mais de cinco séculos após a invasão das Américas, ocupa um lugar de destaque no panteão que constitui a noção de uma identidade brasileira. Vaivém está estruturada em seis núcleos temáticos e trans‑históricos que trazem documentos e obras produzidas por artistas e intelectuais que ditam as permanências e rupturas das imagens das redes de dormir na arte e cultura visual no Brasil. Dessa maneira, no futuro, quando estivermos no vaivém de uma rede, saberemos que se trata de um objeto que possui uma trajetória que balança entre as histórias do país e a relação afetiva de cada um de nós. — Raphael Fonseca, curador
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Conhecemos bem a sensação de deitar em uma rede de dormir: enquanto nos ajeitamos em sua estrutura mole, ela nos acolhe. E, à medida que o corpo se instala, a rede se movimenta, embalando-nos com seu vaivém característico. Como e quando essa sensação de acolhimento se tornou sinônimo de pertencimento identitário? Longe de reforçar os estereótipos da tropicalidade, esta exposição investiga suas origens: ao revisitar o passado, conseguimos compreender como um fazer ancestral criado pelos povos ameríndios foi apropriado pelos europeus e, mais de cinco séculos após a invasão das Américas, ocupa um lugar de destaque no panteão que constitui a noção de uma identidade brasileira. Vaivém está estruturada em seis núcleos temáticos e trans‑históricos que trazem documentos e obras produzidas por artistas e intelectuais que ditam as permanências e rupturas das imagens das redes de dormir na arte e cultura visual no Brasil. Dessa maneira, no futuro, quando estivermos no vaivém de uma rede, saberemos que se trata de um objeto que possui uma trajetória que balança entre as histórias do país e a relação afetiva de cada um de nós. — Raphael Fonseca, curador
Resistências e Permanências
As redes de dormir podem ser vistas como símbolos de resistência e permanência dos povos originários do Brasil. Mesmo com séculos de colonização e com as recentes crises políticas quanto aos direitos indígenas, elas se perpetuaram como uma das muitas tecnologias ameríndias. Neste núcleo, apresentamos obras de artistas que em sua maioria são indígenas e que olham para esses objetos como conexão: entre gerações, entre mulheres ou entre indivíduos que buscam o cumprimento dos direitos humanos. Devido a sua história milenar, a rede pode ser vista entre a ancestralidade e a contemporaneidade. Aqui, ela é pensada por artistas que a associam a uma perspectiva mais política, que simboliza a luta pela sobrevivência das muitas culturas indígenas que pulsam no Brasil.
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RESISTÊNCIAS E PERMANÊNCIAS As redes de dormir podem ser vistas como símbolos de resistência e permanência dos povos originários do Brasil. Mesmo com séculos de colonização e com as recentes crises políticas quanto aos direitos indígenas, elas se perpetuaram como uma das muitas tecnologias ameríndias. Neste núcleo, apresentamos obras de artistas que em sua maioria são indígenas e que olham para esses objetos como conexão: entre gerações, entre mulheres ou entre indivíduos que buscam o cumprimento dos direitos humanos. Devido a sua história milenar, a rede pode ser vista entre a ancestralidade e a contemporaneidade. Aqui, ela é pensada por artistas que a associam a uma perspectiva mais política, que simboliza a luta pela sobrevivência das muitas culturas indígenas que pulsam no Brasil.
Sem título 1, da série Toototobi
Impressão com tinta pigmentada mineral sobre papel Hahnemühle Photo Rag Baryta 315 g 81 x 108 cm
Claudia Andujar

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Sem título 1 - da série Toototobi, 2010 Claudia Andujar Impressão com tinta pigmentada mineral sobre papel Hahnemühle Photo Rag Baryta 315 g 81 x 108 cm Claudia Andujar (Suíça, 1931) migrou para São Paulo em 1957. Em 1970, fez parte de uma equipe de fotógrafos que produziu uma extensa reportagem sobre a região amazônica, onde a artista permaneceu durante cinco anos, vivendo com os yanomâmis. Essa experiência é um marco em sua trajetória: a vida dos ianomâmis tornou-se o principal tema de sua atividade como fotógrafa e o centro de sua atuação política, campos que se fundiram. Em suas fotografias, a rede aparece como elemento constitutivo da vida dos indígenas da região do Catrimani, em Roraima. A utilização da rede cria um espaço/tempo de repouso ou ludicidade, de utilização individual ou coletiva, tanto no interior da maloca quanto em meio à floresta. A rede também concentra uma importante dimensão de cuidado e cura. Entre as fotografias expostas, a mais recente registra as redes usadas na 4ª Assembleia da Hutukara Associação Yanomami, em Toototobi, no Amazonas.
As Transformações do Criador Temerõ e Seu Irmão Gêmeo Laposié que Falam do Algodão na Nossa Cosmologia
Série de desenhos em papel Canson e caneta Posca 29,7 x 42 cm
Yermollay Caripoune

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As Transformações do Criador Temerõ e Seu Irmão Gêmeo Laposié que Falam do Algodão na Nossa Cosmologia, 2019 Yermollay Caripoune Série de desenhos em papel Canson e caneta Posca 29,7 x 42 cm Yermollay Caripoune (Adamnã —Desenhado Pintado Escrito) vive na região do Oiapoque, entre o estado do Amapá e a fronteira com a Guiana Francesa. Sua pesquisa aborda as relações e dissensões entre os saberes tradicionais e científicos. Nessa série de desenhos, o artista apresenta a narrativa dos caripunas sobre a origem das redes de dormir. Segundo a tradição, nos tempos antigos, os caripunas não usavam roupas. Havia um casal que morava no Monte Taminã e que cultivava uma roça com muitas variedades de plantas. Quando a esposa ficou grávida, o marido fabricou uma esteira de junco para receber a criança. Nasceu uma menina bonita, bem branca e sorridente, mas que não conseguiu sobreviver. Seus pais ficaram muito tristes com sua morte. O pai enrolou a filha na esteira de junco e a enterrou no quintal. Foi então que Temerõ (o Criador) fez nascer o kotõ (algodão): uma árvore vermelha, cujas sementes são muito brancas. Temerõ apareceu em sonho para a mãe e a instruiu sobre como coletar o algodão, processar e fabricar os fios. Assim, ela começou a fazer redes e roupas e repassou esse conhecimento para as outras mulheres da aldeia. O Criador disse ainda que, todas as vezes que a mãe se lembrasse da filha, seria capaz de criar redes. Sendo assim, ainda hoje, as mulheres levam as sementes de algodão para serem plantadas na roça em outubro. Nesse mesmo período, os caripunas fazem a Festa do Turé. Durante a celebração, as mulheres preparam o laku (local sagrado em forma de roda) enfeitado de algodão e a menina comparece espiritualmente à festa.
Sem título
Madeira, cipó, tecido 70 x 50 x 180 cm
Francisco Klinger Carvalho

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Francisco Klinger Carvalho Sem título, 1990 Madeira, cipó, tecido 70 x 50 x 180 cm Francisco Klinger explora temáticas socioeconômicas latino-americanas, interessado na possibilidade de problematizar o desaparecimento indígena. Em uma de suas obras, por exemplo, a rede é envolta por uma série de cipós e assemelha-se a uma peça embalsamada. A configuração formal desses objetos parece remeter a um tipo de uso mágico, ao mesmo tempo que reforça a ausência de utilidade prática de artigos que, ficcionalmente, perderam seus usuários. O artista, como uma espécie de arqueólogo, recolhe e emula objetos feitos de matéria orgânica e cria ficções formais que estão entre o sagrado e o mórbido. A presença da morte se faz notar, mas Klinger não deseja ser partidário das grandes narrativas do massacre: para ele, a morte deve ser observada dentro do inevitável ciclo da vida, e essas composições são vistas como um vocabulário de possibilidades em torno do desaparecimento.
A rede como escultura, a escultura como rede
As redes de dormir podem ser vistas como símbolos de resistência e permanência dos povos originários do Brasil. Mesmo com séculos de colonização e com as recentes crises políticas quanto aos direitos indígenas, elas se perpetuaram como uma das muitas tecnologias ameríndias. Neste núcleo, apresentamos obras de artistas que em sua maioria são indígenas e que olham para esses objetos como conexão: entre gerações, entre mulheres ou entre indivíduos que buscam o cumprimento dos direitos humanos.
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A REDE COMO ESCULTURA, A ESCULTURA COMO REDE As redes de dormir podem ser vistas como símbolos de resistência e permanência dos povos originários do Brasil. Mesmo com séculos de colonização e com as recentes crises políticas quanto aos direitos indígenas, elas se perpetuaram como uma das muitas tecnologias ameríndias. Neste núcleo, apresentamos obras de artistas que em sua maioria são indígenas e que olham para esses objetos como conexão: entre gerações, entre mulheres ou entre indivíduos que buscam o cumprimento dos direitos humanos.
Rede Indígena: Extensão Wapichana
Série de serigrafias sobre tecido 60 x 80 cm
Gustavo Caboco

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Rede Indígena: Extensão Wapichana, 2019 Gustavo Caboco Série de serigrafias sobre tecido 60 x 80 cm Um conjunto de oito imagens dita a narrativa autobiográfica de Gustavo Caboco. Filho de Lucilene, mulher uapixana, de Roraima, o artista enxerga-se como uma extensão entre essa origem e a cidade onde foi criado, Curitiba. O objeto-rede não se configurou em sua vida como algo cotidiano, mas agora, ao olhar para ele, é observado como uma maneira de se conectar com parentes que não são vistos mais como distantes. Cada um desses desenhos-estandartes se apresenta como uma alegoria sobre diferentes modos de se relacionar com suas origens e sua identidade: (1) a “rede-paraná” e a conexão com a terra indígena Canauanim; (2) a “rede-passagem” e o olhar para o objeto como uma ponte entre culturas; (3) a “rede-mãe” e a relação com sua mãe e avó; (4) a “rede-bananeira” e a relação com as raízes e alimentação da comunidade uapixana; (5) a “rede-buriti” e o ato físico de plantar bananeira como forma de se conectar com a terra; (6) a “rede-Duit” e a presença de Makunaima – ou Duit – no corpo de seu irmão (7) a “rede-Grünberg” e o olhar para Vista Alegre, em Roraima, local de falecimento tanto de sua avó Maria, em 2013, quanto do viajante alemão Koch-Grünberg, em 1924; e (8) a “rede-damorida”, o objeto instalado em uma panela de barro enquanto o artista cozinha uma damorida, um prato de origem dos povos indígenas de Roraima feito com bastante pimenta.
Registro fotográfico da Performance 100 rede para o Itaú Cultural – Avenida Paulista
Cópia de exposição 30 x 50 cm
Tunga

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Registro fotográfico da Performance 100 rede para o Itaú Cultural – Avenida Paulista, 1997 Tunga Cópia de exposição 30 x 50 cm As redes estão presentes em muitas obras de Tunga, não apenas por seu apelo plástico, mas também pelo olhar político para a história do Brasil. 100 Rede foi uma ação realizada em 1997 em São Paulo. Devido à comemoração do Dia da Cultura, Tunga e outros artistas receberam comissionamentos de esculturas a serem expostas na Avenida Paulista. Em vez de produzir um objeto, Tunga convocou 100 homens para realizar uma ação durante a cerimônia de abertura do evento. Vestidos com camisas brancas numeradas de 1 a 100, calças jeans, sapatos e chapéus e empurrando um carrinho de feira, eles pararam em determinado ponto da avenida, armaram suas redes e comeram suas quentinhas. O arquétipo do imigrante nordestino e dos trabalhadores que têm de almoçar perante o olhar alheio foi ecoado em meio a um evento formal. Além disso, a proposição questiona as noções de “trabalho” e “trabalho de arte”. E, como de costume na poética de Tunga, se, por um lado, podemos notar elementos que dialogam com a “cultura brasileira”, por outro, o texto que os realizadores proclamaram durante a ação adicionou dados discrepantes a uma interpretação nacionalista: o poema “A Fênix e a Pomba”, publicado por Shakespeare em 1601. O uso das redes demonstra o interesse do artista em explorar e desafiar as leis naturais de gravidade, força e peso. Sua pesquisa o levou a uma espécie de obsessão com as possibilidades que o ato de erguer objetos com linhas e tramas de diferentes espessuras e materiais proporcionam, como na obra Berço com Crânios. Nessa última, a brevidade da vida é alegorizada com a utilização de ossos repousados sobre pequenas redes-berços. A rede não apenas é espaço de repouso e respiração, mas também pode ser usada como uma lembrança da morte.
A-B-A
Chapa de ferro e corda de poliéster 02 chapas | 50 x 50 x 1 cm cada
Ernesto Neto

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A-B-A, 1987 Ernesto Neto Chapa de ferro e corda de poliéster 02 chapas | 50 x 50 x 1 cm cada A pesquisa de Ernesto Neto está entre a escultura e a instalação, buscando a articulação formal e simbólica entre matérias diversas. A série A-B-A, composta de chapas de metal e pedaços de corda, é uma de suas primeiras obras. Se nesses trabalhos não temos a presença literal das redes — utilizadas em algumas de suas instalações mais recentes —, notamos um jogo de equilíbrio e tensão entre dois pontos que nos recorda a forma como os objetos são estruturados.
Rede Social
Oito redes unidas e com chocalhos de plástico nas varandas Variável
OPAVIVARÁ!

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Rede Social, 2017-2019 OPAVIVARÁ! Oito redes unidas e com chocalhos de plástico nas varandas Variável O coletivo carioca OPAVIVARÁ! propõe subversões poéticas nos modos de uso e ocupação de espaços públicos e institucionais através de dispositivos relacionais que proporcionam experiências interativas para serem vivenciadas coletivamente. Um dos objetivos é propiciar uma reflexão acerca dos fenômenos estéticos e políticos que permeiam as relações desenvolvidas no cotidiano. A recodificação das culturas ancestrais que compõem a “cultura brasileira” é também um dos interesses centrais do coletivo, cujas propostas flertam com rituais universais, como os atos coletivos de beber e comer, as festas e atividades de lazer em grupo. Rede Social convida o visitante ao repouso e ao compartilhamento. A obra reconfigura o espaço para se estar demoradamente, possibilitando a fruição da convivência. Em seu título, uma brincadeira com a relação entre uma rede de descanso coletiva e as redes sociais virtuais que tanto consomem nosso tempo.
Olhar para o outro, olhar para si
Desde o princípio da invasão das Américas, as redes chamaram a atenção dos europeus. Sendo uma tecnologia desconhecida por eles, rapidamente sua forma foi disseminada em mapas, pinturas, livros de viajantes e, posteriormente, fotografias e filmes. Este núcleo traz documentos e imagens que desejaram não apenas registrar aspectos da vida local durante a colonização, mas também criar narrativas fantasiosas. Com a dificuldade de traslado ao Brasil e as restrições quanto à entrada de não portugueses, muitas das imagens produzidas durante o período colonial eram feitas a partir da cópia e adaptação de gravuras de outros autores. Sua participação no processo de colonização do conhecimento foi essencial e com diferentes intenções. Porém, esse olhar pautado exclusivamente na alteridade não é o bastante para revisarmos nossas histórias: como diferentes artistas contemporâneos indígenas olham para si e para as redes de dormir? Buscando um tensionamento da solidez do imaginário colonial, artistas foram convidados a desconstruir a visão eurocêntrica dessas imagens a respeito de seus antepassados e propor novas narrativas. Na incapacidade de apagar as violências, ao menos é possível sugerir outras maneiras de olhar o presente e almejar o futuro.
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OLHAR PARA O OUTRO, OLHAR PARA SI Desde o princípio da invasão das Américas, as redes chamaram a atenção dos europeus. Sendo uma tecnologia desconhecida por eles, rapidamente sua forma foi disseminada em mapas, pinturas, livros de viajantes e, posteriormente, fotografias e filmes. Este núcleo traz documentos e imagens que desejaram não apenas registrar aspectos da vida local durante a colonização, mas também criar narrativas fantasiosas. Com a dificuldade de traslado ao Brasil e as restrições quanto à entrada de não portugueses, muitas das imagens produzidas durante o período colonial eram feitas a partir da cópia e adaptação de gravuras de outros autores. Sua participação no processo de colonização do conhecimento foi essencial e com diferentes intenções. Porém, esse olhar pautado exclusivamente na alteridade não é o bastante para revisarmos nossas histórias: como diferentes artistas contemporâneos indígenas olham para si e para as redes de dormir? Buscando um tensionamento da solidez do imaginário colonial, artistas foram convidados a desconstruir a visão eurocêntrica dessas imagens a respeito de seus antepassados e propor novas narrativas. Na incapacidade de apagar as violências, ao menos é possível sugerir outras maneiras de olhar o presente e almejar o futuro.
Série Sertão
Fotografia 33 x 50 cm
Maureen Bisilliat

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Série Sertão, década de 1960 Maureen Bisilliat Fotografia 33 x 50 cm Maureen Bisilliat imigrou para o Brasil em 1957, quando trocou a pintura pela fotografia. A emblemática sala Xingu Terra, da 13ª Bienal de São Paulo de 1975, foi um projeto de sua autoria juntamente com o sertanista Orlando Villas-Bôas, um dos responsáveis pela criação do Parque Nacional do Xingu. Maureen é autora de livros de fotografia inspirados em obras de grandes escritores brasileiros e sobre regiões específicas do país. Sua produção está presente em dois momentos distintos da exposição: no núcleo “Invenções do Nordeste”, no qual suas fotografias revelam a rede como a companheira certa na vida dura que os habitantes do sertão levam. As imagens produzidas em Juazeiro do Norte, no Ceará, evocam certa melancolia do sertanejo. Já no núcleo “Olhar para o Outro, Olhar para Si” estão presentes fotografias de indígenas feitas no Xingu. As imagens das redes, com ou sem os corpos, têm o peso do tempo, que passou e acumulou o sofrimento dos povos originários. Em ambas as séries fotográficas, nota-se o caráter lacônico dos retratados.
Pescadores na Margem do Rio Amazonas
Fotografia 18,5 x 23,6 cm
Albert Frisch

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Pescadores na Margem do Rio Amazonas, 1865 Albert Frisch Fotografia 18,5 x 23,6 cm Albert Frisch realizou fotografias na Amazônia em 1867, produzindo um dos primeiros registros fotográficos dos indígenas da região. Por isso, é considerado o primeiro “fotógrafo viajante” a ter imagens da Amazônia. Com uma produção de caráter próximo ao etnográfico, ele foi o fotógrafo integrante da expedição organizada pelo engenheiro Franz Keller- Leuzinger. Frisch fotografou diversos indígenas que residiam próximo aos Rios Amazonas, Madeira, Negro, Solimões e Tarumã. No que diz respeito a esse momento histórico, com a fotografia tendo pouco mais de 30 anos de existência, as técnicas de captura da imagem ainda se faziam perante poses que tinham durações estendidas. Além disso, os indígenas nunca haviam passado pela experiência de ser fotografados. A rede aparece em diferentes posições nas composições, inclusive no autorretrato de Frisch no Rio Tarumã, com ela dentro da canoa.
História verdadeira e descrição de uma terra de selvagens, nus e cruéis comedores de seres humanos, situada no novo mundo da América...
Warhaftig Historia und Beschreibung Einer Landtschafft der Wilden, Nacketen, Grimmigen Menschfresser Leuthen, in der Newenwelt America Gelegen… Cópia de exposição 19,5 x 13,5 cm
Hans Staden

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Warhaftig Historia und Beschreibung Einer Landtschafft der Wilden, Nacketen, Grimmigen Menschfresser Leuthen, in der Newenwelt America Gelegen… (História verdadeira e descrição de uma terra de selvagens, nus e cruéis comedores de seres humanos, situada no novo mundo da América...), 1557 Hans Staden Cópia de exposição 19,5 x 13,5 cm Em diversas culturas ameríndias, as redes são entendidas como uma extensão do corpo físico— acompanham o indivíduo desde o nascimento até a morte. As gravuras deste grupo trazem impressões de diferentes criadores de imagens a respeito dos rituais fúnebres praticados por povos indígenas do Brasil. Um olhar atento notará que formalmente muitas dessas imagens são semelhantes. As publicações dos viajantes europeus Hans Staden, Jean de Léry e André Thevet—todas do século 16 — disseminaram-se pela Europa e criaram um imaginário impactante sobre as Américas. Foi isso que levou a um grande editor como Theodore de Bry— holandês que nunca esteve no Brasil— a produzir um livro acerca do país baseado na imitação e reconfiguração das publicações anteriores. Suas imagens são semelhantes a fotomontagens criadas para sugerir maior verossimilhança ao público europeu. É interessante constatar como algumas tradições de imagens permanecem até o século 19 e em autores como Denis e Taunay — a concepção de uma narrativa visual convincente era mais importante do que o relato antropológico.
Disseminações - entre o público e o privado
Uma vez constatada a praticidade das redes como mobiliário tanto para viajar quanto no âmbito doméstico, seu uso foi apropriado pelos portugueses, franceses e holandeses que invadiram o Brasil. Neste núcleo, vemos obras em que as redes são associadas não mais aos povos originários, mas a diversos aspectos das primeiras grandes cidades brasileiras. Sua presença foi registrada em diferentes atividades do cotidiano no Brasil colonial: do uso do objeto como meio de transporte às práticas funerárias, ficam visíveis os privilégios sociais, raciais e econômicos de uma sociedade brasileira que está no passado, mas ecoa no presente. São imagens que serão associadas a ideias predominantes sobre os trópicos entre os séculos 18 e 19, especialmente devido à abertura dos portos a não portugueses em 1808 e a entrada de artistas, comerciantes, militares e curiosos europeus que aumentaram o número de publicações a respeito do país e foram capazes de disseminá‑las por meio de gravuras. Os lugares que as redes ocupam na vida contemporânea no Brasil — em especial na Região Norte — também estão pontuados neste núcleo. Sendo essa a região que concentra o maior número de indígenas, nada mais justo que as redes se misturem a diversos momentos do cotidiano.
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DISSEMINAÇÕES: ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO Uma vez constatada a praticidade das redes como mobiliário tanto para viajar quanto no âmbito doméstico, seu uso foi apropriado pelos portugueses, franceses e holandeses que invadiram o Brasil. Neste núcleo, vemos obras em que as redes são associadas não mais aos povos originários, mas a diversos aspectos das primeiras grandes cidades brasileiras. Sua presença foi registrada em diferentes atividades do cotidiano no Brasil colonial: do uso do objeto como meio de transporte às práticas funerárias, ficam visíveis os privilégios sociais, raciais e econômicos de uma sociedade brasileira que está no passado, mas ecoa no presente. São imagens que serão associadas a ideias predominantes sobre os trópicos entre os séculos 18 e 19, especialmente devido à abertura dos portos a não portugueses em 1808 e a entrada de artistas, comerciantes, militares e curiosos europeus que aumentaram o número de publicações a respeito do país e foram capazes de disseminá‑las por meio de gravuras. Os lugares que as redes ocupam na vida contemporânea no Brasil — em especial na Região Norte — também estão pontuados neste núcleo. Sendo essa a região que concentra o maior número de indígenas, nada mais justo que as redes se misturem a diversos momentos do cotidiano.
Tipivão: Pernambucano
Aquarela 35 x 45,5 cm
H. Lewis

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Tipivão: Pernambucano, 1848 H. Lewis Aquarela 35 x 45,5 cm Nestas imagens, as redes estão descritas como meio de transporte no contexto do sistema escravocrata no Brasil e denotam jogos de poder e de privilégios sociais, não sendo mais apenas um mero objeto usado para o repouso. Elas revelam como o olhar eurocêntrico construiu imagens diretamente proporcionais aos diferentes graus de violência da colonização, com a observação de que as redes foram utilizadas para registrar as diversas esferas sociais vistas no território brasileiro, notadamente a escravidão. A imagem é a de dois homens negros que levam uma rede sobre suas costas. Mesmo protegidos por chapéus, são eles que recebem o calor do sol sobre o corpo, ao passo que dentro desses transportes ricamente adornados iam os brancos protegidos por cortinas. Chama a atenção a permanência do contato direto desses corpos negros com o chão, trazendo à tona as claras contradições entre ostentação e dominação no Brasil. Advindos das fazendas ou dos centros urbanos, esses meios de transporte e comodidade dos proprietários de terra eram sempre sustentados pelo corpo de homens negros.
Cadeira Tripé, reedição da Nucleon 8
Ferro e soleta de couro 75 x 63 x 81,5 cm
Lina Bo Bardi & Giancarlo Palanti

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Cadeira Tripé, reedição da Nucleon 8, 1990 Lina Bo Bardi e Giancarlo Palanti Ferro e soleta de couro 75 x 63 x 81,5 cm Lina Bo Bardi foi uma arquiteta e designer italiana que imigrou para o Brasil na década de 1940. Na busca por um mobiliário moderno, debruçou-se sobre os tipos de madeiras e têxteis brasileiros. Atenta aos costumes da população economicamente menos favorecida, conheceu as redes de balanço dos “navios gaiola” que percorrem os rios do Norte do Brasil e as transformou em inspiração para a criação de cadeiras com uma linguagem que resgata elementos culturais, sem descuidar da estética nem dos conceitos disseminados pelos modernistas. Lina criou três modelos de cadeiras a partir da observação das redes. Uma delas intitula-se “Cadeira Preguiçosa”: o apoio para o corpo é feito de sisal e sua linha curvilínea assemelha-se ao artefato indígena. Já os outros dois modelos são chamados de “Poltrona Tripé” e “Cadeira de Três Pés”. O primeiro foi confeccionado com uma madeira torneada e o segundo, feito de conduíte.
Na Rede
Óleo sobre tela 42 x 62 x 5 cm
Ranchinho

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Na Rede, 1986 Ranchinho Óleo sobre tela 42 x 62 x 5 cm A bibliografia tradicional sobre o pintor Ranchinho geralmente salienta seu autodidatismo e sua dificuldade de sociabilização devido a problemas físicos e mentais desde a infância. Sua temática aponta tanto para o mundo rural do interior paulista quanto para as cenas urbanas. É interessante observar que Ranchinho se insere em algumas imagens que produz. Logo, poderia ter se representado nesta pintura. Vemos uma figura masculina deitada em uma rede azul numa varanda, com a face voltada para o espectador. Vestindo uma camisa entreaberta, está fumando e deixou sob a rede um par de botas, uma faca e um pedaço de fumo de rolo— elementos do momento de descanso de um trabalhador do campo.
A Rede (Vistas e figurinos da cidade e das cercanias do Rio de Janeiro, Brasil)
Cópia de exposição 27 x 37 cm
Henry Chamberlain

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A Rede (Vistas e figurinos da cidade e das cercanias do Rio de Janeiro, Brasil), 1822 Henry Chamberlain Cópia de exposição 27 x 37 cm Além de cenas do cotidiano nos quais a rede estava presente, o conjunto mostra principalmente imagens que representam o enterro de pessoas negras. As redes denotam distintas posições sociais através de seu uso: quando, por exemplo, a representação é do enterro de uma pessoa da realeza africana em solo americano, ele acontece com grande cortejo em via pública. Do mesmo modo que é possível distinguir as classes sociais através da comparação da rede com carroças e cadeirinhas, uma cena de enterro faz com que percebamos o contraste entre a realeza e uma pessoa comum. Independentemente da hierarquia social daquelas pessoas negras que eram enterradas nas redes de dormir, elas nunca seriam possuidoras do mesmo estatuto que os separava dos homens livres.
Modernidades - espaços para a preguiça
Uma vez que o Brasil se tornou independente de Portugal (1822) e, posteriormente, uma república (1889), as redes começaram a ser vistas como algo que ia contra o processo civilizatório e o desejado progresso industrial da jovem nação. No fim do século 19, apareceram as primeiras publicações em revistas ilustradas que associavam a rede à preguiça. Essa relação se tornou uma das visões mais repetidas dentro do senso comum brasileiro e se perpetuou em nosso imaginário social. O núcleo é iniciado com essas imagens e reflete sobre como, a partir do começo do século 20, as redes foram associadas não apenas à preguiça, mas à estafa e ao descanso decorrentes do encontro entre o trabalho braçal e o calor tropical. Lugar importante desse percurso histórico é ocupado por Macunaíma (1928), livro de Mário de Andrade em que o personagem principal passa grande parte da narrativa deitado em uma rede. A viagem que o autor fez ao Norte do Brasil (1927) e as maneiras como o texto se transformou em diversas imagens, desde seu lançamento até a atualidade, também estão presentes neste núcleo. Rever o peso de Macunaíma e o lugar do indianismo na modernidade brasileira é algo essencial para reavaliarmos a história da arte no Brasil a partir de uma perspectiva crítica.
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MODERNIDADES: ESPAÇO PARA A PREGUIÇA Uma vez que o Brasil se tornou independente de Portugal (1822) e, posteriormente, uma república (1889), as redes começaram a ser vistas como algo que ia contra o processo civilizatório e o desejado progresso industrial da jovem nação. No fim do século 19, apareceram as primeiras publicações em revistas ilustradas que associavam a rede à preguiça. Essa relação se tornou uma das visões mais repetidas dentro do senso comum brasileiro e se perpetuou em nosso imaginário social. O núcleo é iniciado com essas imagens e reflete sobre como, a partir do começo do século 20, as redes foram associadas não apenas à preguiça, mas à estafa e ao descanso decorrentes do encontro entre o trabalho braçal e o calor tropical. Lugar importante desse percurso histórico é ocupado por Macunaíma (1928), livro de Mário de Andrade em que o personagem principal passa grande parte da narrativa deitado em uma rede. A viagem que o autor fez ao Norte do Brasil (1927) e as maneiras como o texto se transformou em diversas imagens, desde seu lançamento até a atualidade, também estão presentes neste núcleo. Rever o peso de Macunaíma e o lugar do indianismo na modernidade brasileira é algo essencial para reavaliarmos a história da arte no Brasil a partir de uma perspectiva crítica.
Revista Illustrada número 47, capa
17 de dezembro de 1876 Impressão 36,4 x 27,7 cm
Angelo Agostini

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Revista Illustrada número 47, capa, 17 de dezembro de 1876 Angelo Agostini Impressão 36,4 x 27,7 cm Durante a segunda metade do século 19, com a disseminação da técnica de gravura em pedra (litogravura), apareceram no Rio de Janeiro—capital do Império do Brasil — as primeiras revistas ilustradas. Com tiragem periódica, essas publicações traziam charges, caricaturas e comentários sobre a vida na corte, seus aspectos sociais e políticos. A Semana Illustrada surgiu em 1860 e foi editada até 1875. Foi uma dessas primeiras publicações, fundada a partir da parceria entre Karl Linde e os irmãos Karl e Heinrich Fleiuss, todos imigrantes da Alemanha. Com autoria geralmente assinada por esse último, a revista costumava tecer elogios ao governo de dom Pedro II e se ausentava de qualquer discussão mais polêmica. Ela estava baseada na figura do Dr. Semana, personagem que geralmente se encontra em diálogos com uma criança negra escravizada comumente chamada de Moleque. Já o italiano Angelo Agostini chegou ao Brasil em 1859 e pouco a pouco começou a trabalhar com caricaturas e ilustrações. Com um olhar extremamente crítico para a sociedade, tomou parte do movimento abolicionista e não poupava críticas à família de dom Pedro II em suas imagens. Ele fundou a revista A Vida Fluminense (1868–1875) e posteriormente diversas outras aqui presentes, como O Mosquito (1869–1877), Revista Illustrada (1876–1888) e Don Quixote (1895–1903). Nessas crônicas visuais — todas produzidas em pleno processo de desejo de modernização da cultura urbana no Brasil— surgiram as primeiras associações entre as redes e a preguiça. Vistas agora como objetos ligados à vida externa e a algo oposto à industrialização, as redes viraram o torno de todos aqueles que podem ter o privilégio de não trabalhar — de fazendeiros a senadores, as redes são articuladoras de um humor ácido.
Repouso de Koch-Grunberg no Alto Rio Negro
Tinta acrílica sobre tela 90 x 150 x 5 cm
Füãreicü

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Repouso de Koch-Grunberg no Alto Rio Negro, Amazonas, 2005 Füãreicü Tinta acrílica sobre tela 90 x 150 x 5 cm A acrílica Repouso de Koch-Grünberg — Alto Rio Negro/Amazonas, de Füãreicü, faz parte de uma coleção de 74 obras produzidas por artistas contemporâneos indígenas, formados em 2005 pela Escola de Artes do Instituto Dirson Costa de Arte e Cultura da Amazônia (IDC), em Manaus. Elas foram elaboradas por seis artistas de cinco etnias diferentes a partir de imagens e relatos da pesquisa empreendida por Koch-Grünberg na Amazônia no começo do século 20. Entre 1903 e 1905, o etnólogo alemão observou e registrou o cotidiano dos indígenas do Alto Rio Negro. Inclusive, parte significativa desses registros envolve as redes de dormir. Cem anos depois, Füãreicü, que é da etnia ticuna, inverteu a posição de observador e observado, tensionando as relações de alteridade, e pintou Koch-Grünberg preenchendo seu diário de bordo ao fim de um dia de viagem, sentado sozinho em uma rede e cercado por seus objetos pessoais. Füãreicü assumiu um ponto de vista distante, como quem observa um estranho a uma distância segura. Sendo assim, o pesquisador alemão aparece minúsculo na composição, quase que engolido pela paisagem amazônica. Entre o recorte temporal de mais de um século que separa o etnólogo estrangeiro e o artista indígena, a rede sobressai como o único elemento comum para ambos. O Repouso de Koch-Grünberg —Alto Rio Negro/Amazonas, juntamente com as demais 73 obras da coleção, irá compor o acervo fundacional do Museu de Arte e Imaginário da Amazônia (Maia), que está em fase de implantação.
Makunaimî Deitado na Rede Universal
Canson sobre fundo preto de tinta acrílica sobre tela 90 x 90 cm
Jaider Esbell

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Makunaimî Deitado na Rede Universal, 2017 Jaider Esbell Canson sobre fundo preto de tinta acrílica sobre tela 90 x 90 cm Makunaima, para muitos, é um mero índio, e aqui dorme na rede em um lugar inexistente. Para outros, é apenas uma invenção da literatura, algo em desuso –portanto, desnecessário. Supomos que para muitas pessoas as palavras Makunaima ou Makunaíma são ainda completamente novidade. Em duas frentes diretas, pontuamos nossos esforços. A parte que acredita que Makunaíma não tem mesmo caráter nenhum está fora de moda, mas bem representa o Brasil preguiçoso de gente com índole duvidosa. A parte que escuta ou lê sobre o mito Makunaima pela primeira vez são objetos diretos de nossa agência. Ao eleger tais linhas de ação, outra agência é demandada: a contextualização. Assim como o termo “decolonização” tem seus resistentes, o termo “índio” aparece com uso deslocado já por consenso entre as partes que representam o movimento ou os movimentos indígenas. A preguiça e a improdutividade atribuída ao índio – leia-se e fale-se indígena – tem seu peso negativo reforçado com o desconhecimento mínimo do status quo como nascer, viver e trabalhar na floresta. Falo aqui em pré-conceito?
Mário de Andrade na rede
Gravura em metal sobre papel 25 x 31,6 cm
Lasar Segall

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Mário de Andrade na rede, 1930 Lasar Segall Gravura em metal sobre papel 25 x 31,6 cm Publicado em 1928 por Mário de Andrade, Macunaíma é considerado um marco na “cultura brasileira moderna”. Além de olhar para as identidades indígenas, instaurou uma fricção de paisagens, sons, personagens e palavras que vão dos relatos de Köch- Grunberg na Amazônia à desvairada cidade de São Paulo. Macunaíma é um amálgama de culturas apresentadas na forma de um indivíduo fora dos padrões morais estabelecidos: um devoto da “divina preguiça”. Ao observarmos as frases em que a palavra rede é inserida no livro, temos um quadro das associações semânticas estabelecidas pelo autor. Na primeira parte do livro, o objeto é associado à ideia de propriedade individual, ou seja, os personagens deitam em sua rede. Quando chega a São Paulo, Macunaíma nota que as “redes” dali eram estranhas: ele havia se deitado em uma cama e adentrado na intimidade moderna de São Paulo. No decorrer de suas aventuras—assim como na literatura dos viajantes estrangeiros que estiveram no Brasil durante a colonização—, as redes sempre serão relacionadas a atividades vitais do homem: é o espaço do coito, da doença, do ócio, do sono e da morte. Macunaíma só foi transformado em imagem nos anos de 1943 e 1944 pelas mãos do artista argentino Carybé. Já o filme foi lançado no Festival de Brasília em 1969 e foi sucesso imediato de público e crítica. Foi dirigido por Joaquim Pedro de Andrade, filho de Rodrigo Melo Franco de Andrade, que era amigo íntimo de Mário de Andrade e diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico entre 1937 e 1967. A rede de dormir é um tópico recorrente na produção de Mário de Andrade: muitas vezes associada à preguiça, esteve em seus poemas, textos, presentes, fotos e diários, além de ter figurado em seus retratos.
Invenções do nordeste
Também como reflexo da busca pela modernidade no Brasil, as redes foram essenciais para criar identidades regionais baseadas nas ideias de artesanato e folclore. No que diz respeito ao Nordeste, essas representações foram estudadas pelo historiador Durval Muniz no livro A Invenção do Nordeste e Outras Artes (1999). Neste núcleo estão reunidas algumas obras que transformam mitos sobre a relação entre as redes e essa região geográfica em imagens. A associação delas com a seca e a tragédia da migração ao Sudeste, por exemplo, é uma dessas histórias. Enquanto isso, outros trabalhos tecem um elogio ao Nordeste e se utilizam das redes não só como símbolo de orgulho, mas também reflexo da potente indústria têxtil local. Como um objeto pode se tornar ícone de uma região? É importante desnaturalizar a relação entre objeto, regionalismo e identidade.
Vaivém

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INVENÇÕES DO NORDESTE Também como reflexo da busca pela modernidade no Brasil, as redes foram essenciais para criar identidades regionais baseadas nas ideias de artesanato e folclore. No que diz respeito ao Nordeste, essas representações foram estudadas pelo historiador Durval Muniz no livro A Invenção do Nordeste e Outras Artes (1999). Neste núcleo estão reunidas algumas obras que transformam mitos sobre a relação entre as redes e essa região geográfica em imagens. A associação delas com a seca e a tragédia da migração ao Sudeste, por exemplo, é uma dessas histórias. Enquanto isso, outros trabalhos tecem um elogio ao Nordeste e se utilizam das redes não só como símbolo de orgulho, mas também reflexo da potente indústria têxtil local. Como um objeto pode se tornar ícone de uma região? É importante desnaturalizar a relação entre objeto, regionalismo e identidade.
Jangadas e Jangadeiros, Aquiraz – Ceará
Fotografia 50 x 50 cm
Marcel Gautherot

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Jangadas e Jangadeiros, Aquiraz – Ceará, 1950 Marcel Gautherot Fotografia 50 x 50 cm Marcel Gautherot é considerado um “fotógrafo viajante”. De origem francesa, radicou-se no Brasil, sendo reconhecido por suas fotografias da arquitetura moderna brasileira e do patrimônio histórico do Iphan. Nos anos 1940, viajou pelo Rio São Francisco e fez o registro dos tipos humanos e das festas populares e religiosas com um olhar quase antropológico. Dessa viagem, ficou também o registro da rede como parte do transporte fluvial presente nas Regiões Norte e Nordeste do país. Uma imagem parece resumir bem a tensão entre descanso e trabalho, tradição e modernidade. Descrita como Jangadeiro Descansando em Rede Primordial, trata-se de um jangadeiro que é capturado de costas, mas adormecido perante a câmera. A imagem une o ato do trabalho na pesca, a principal atividade dos jangadeiros, com a entrega do corpo cansado ao sol. Essa fotografia foi uma das imagens selecionadas por Lucio Costa para compor sua instalação Riposatevi na Trienal de Milão de Arquitetura, em 1964.
Sem título
Tecido e linha de algodão, crochê e costura 150 x 370 x 120 cm
Adriana Aranha

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Sem título, 2007 Adriana Aranha Tecido e linha de algodão, crochê e costura 150 x 370 x 120 cm Nesta série de Adriana Aranha, percebemos um olhar especulativo sobre os objetos comuns. As redes perdem sua função utilitária e tornam-se imagens disruptivas; não comportam mais o corpo humano para o sono e passam a instigar a reflexão sobre outras dimensões da vida cotidiana. Confeccionadas artesanalmente na Paraíba—estado natal da artista—, sua cor preta chama a atenção por ser pouco comum nas redes produzidas localmente. O objeto associado à tropicalidade e ao lazer, quando feito em cores escuras, pode ser enxergado como uma lembrança da morte.