
Paul Klee - Equilíbrio Instável
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Paul Klee

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INTRODUÇÃO Paul Klee (1879–1940) é um dos artistas mais importantes da modernidade clássica. Nascido e criado em Berna, capital da Suíça, ainda jovem se sentiu atraído por Munique, cidade que era um dos mais importantes polos artísticos da época. Lá conheceu a futura esposa, a pianista Lily Stumpf, bem como os protagonistas da vanguarda alemã. Wassily Kandinsky apresentou-o, entre outros, a Franz Marc e aos demais artistas do grupo Der Blaue Reiter (O Cavaleiro Azul), e Klee passou a frequentar a efervescente cena cultural da cidade. Até sua famosa viagem para a Tunísia, realizada no início de 1914 com Louis Moilliet e August Macke, Klee destacava-se por ser um excepcional desenhista. Posteriormente, desenvolveu uma linguagem visual própria, afastando-se do modelo da natureza, que havia estudado intensamente na juventude. Na Tunísia expandiu seu repertório artístico, criando uma linguagem visual abstrata em aquarelas de pequenos formatos e explorando de maneira intensa o uso da luz e da cor. Paul Klee – que tinha passaporte alemão devido à nacionalidade do pai – foi recrutado para servir entre os anos de 1916 e 1918 na Primeira Guerra Mundial. Como não foi destacado para os campos de batalha, sobrou-lhe tempo para prosseguir com sua trajetória artística, vindo a se tornar um dos artistas mais prestigiados daquele período. Por essa razão, em 1921 passou a lecionar na recém-inaugurada Bauhaus, uma escola vanguardista de design e arquitetura estabelecida na Alemanha, primeiro em Weimar e mais tarde em Dessau. Surgiram nessa época, entre outros, desenhos construtivistas e obras nas quais Klee explorou a relação entre as cores. As atribuições como professor aos poucos foi se tornando insuportável para o artista, pois era pouco o tempo que lhe restava para a criação individual. Em 1931, transferiu-se para a Academia de Arte de Düsseldorf, onde era possível organizar de modo mais livre a atividade docente. Após a tomada de poder pelos nacional-socialistas, Paul Klee, como muitos de seus amigos artistas, foi perseguido e boicotado. No Natal de 1933, Paul e Lily emigraram para Berna, depois de ele ter sido atacado pelos meios de comunicação e sua casa ter sido revistada. Até sua morte, em 1940, foi lá que Klee passou os últimos anos de sua vida, isolado, desenvolvendo uma obra multifacetada e abrangente. Paul Klee – equilíbrio instável é a mais completa retrospectiva sobre o artista já realizada na América Latina, apresentando um conjunto de 123 obras pertencentes ao acervo do Zentrum Paul Klee, localizado em Berna, Suíça. Fabienne Eggelhöfer Curadora - Zentrum Paul Klee
Desenhos de Infância
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DESENHOS DE INFÂNCIA A avó Anna Catharina Rosina Frick despertou muito cedo em Paul Klee o prazer de desenhar e preservou o uso da mão esquerda pelo neto. Posteriormente, o próprio artista definiu seus primeiros desenhos como ilustrações de cenas e contos fantásticos. Já adulto, em 1911 Klee decidiu organizar os seus trabalhos desenvolvidos até então, na forma de um catálogo manuscrito de obras, deixando de fora apenas aqueles trabalhos iniciais em que ele julgava faltar “autossuficiência criativa”. Ele reconheceu em seus desenhos de infância – assim como em registros visuais arcaicos – uma naturalidade da expressão pictórica e uma redução à essência que almejava em sua criação artística. A partir dessa constatação, incluiu alguns desses desenhos de infância em seu catálogo de obras.
Árvore de Natal com anjo e trem de brinquedo / Árvore de Natal com anjo e relógio (Weihnachtsbaum mit Christkind u. Eisenbahn / Weihnachtsbaum mit Christkind u. Uhr)
Lápis e giz sobre papel sobre cartão, duas partes 24 x 32 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Árvore de Natal com anjo e trem de brinquedo, 1884, 3 e Árvore de Natal com anjo e relógio, 1884, 4 Lápis e giz sobre papel sobre cartão, duas partes 24 x 32 cm Centro Paul Klee, Berna A Descoberta da Infância Os desenhos de infância de Klee tinham sido guardados para ele por sua irmã Mathilde. Em 1911 ela os devolveu a Klee que, então, reconheceu muitos de seus desenhos como obras de arte e os registrou em seu Catálogo de Obras. Anos depois, quando Klee já era reconhecido enquanto artista, ele usou esses desenhos como uma oportunidade de aproximar sua arte de desenhos de crianças. Dessa maneira, ele atribuiu uma certa naturalidade a seu trabalho criativo e pôde construir sua biografia desde muito cedo. Os desenhos anteriores a 1890 mostram suas análises de livros ou jornais, ou apontam para uma preocupação com seu entorno. Paul Klee veio de uma família de músicos que demandou muito de seus dois filhos, enquanto pouca atenção era dada para pintura e desenho. Como resultado disso, Klee não teve nenhuma aula sistemática de desenho, mas desenvolveu suas habilidades informalmente. Os desenhos escolares apresentam uma segurança cada vez maior quanto ao uso de técnicas gráficas. Durante esse período, ele usava predominantemente cadernos de desenho pequenos e folhas soltas. Além disso, há desenhos engraçados nas margens de seus livros didáticos, aos quais Klee não atribuiu posteriormente valor artístico algum. Em seus desenhos de paisagens, Klee se limitava majoritariamente às localidades próximas, como o Elfenau, ou documentava os passeios até a casa de sua tia no Oberland Bernês ou jornadas com seu pai a Tessin. Rascunhos criados espontaneamente eram elaborados em detalhe em seu quarto - que ele chamava de “seu recanto”. Seus desenhos e caricaturas desse período são ainda reproduções detalhadas de coisas que ele observava, sem nenhuma caracterização, simplificação ou abstração. Com seus desenhos de paisagens Klee se inscreveu em 1898 para a Academia de Munique e foi rejeitado. A justificativa foi de que lhe faltava prática em desenho figurativo. Depois disso, Klee se matriculou na Escola de Desenho de Heinrich Knirr.
Família à mesa (Familie bei Tisch) / Crianças em sequência (Kinder hintereinander)
Lápis e giz sobre papel sobrecartão, três partes 32 x 24 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Família à mesa, 1885, 5; Crianças em sequência, 1885, 6 e Senhora à mesa com vinho tinto, 1885, 7 Lápis e giz sobre papel sobre cartão, três partes 32 x 24 cm Centro Paul Klee, Berna Os motivos favoritos do jovem Paul vêm inteiramente dos ambientes que o cercam. Há a sua própria família, flores, animais, o circo ou a feira. As figuras são geralmente retratadas de perfil ou vistas de frente. Prédios ou um carrossel são desenhados a partir de um ponto de vista lateral sem se levar em consideração a questão da perspectiva. Nesses desenhos infantis se torna claro como Klee, ainda criança, interpreta a convivência com adultos, sobretudo com seus pais. Em sua maioria, as crianças são desenhadas muito menores e os adultos, por sua vez, são aumentados consideravelmente, resultando numa hierarquia clara. As figuras masculinas dominam os desenhos. As mulheres, muitas vezes, são representadas vestindo chapéus marcantes, sobressaias e acessórios como bolsas e guarda-chuvas. Em “Família à mesa” ele desenha sua própria família. Seu pai Hans Wilhelm e sua mãe Ida Maria, incluindo a si mesmo como uma figura menor no lado direito do desenho. O pai, no meio e atrás da mesa, é apresentado como um sujeito grande, corpulento, com uma expressão facial excitada e de gestos raivosos. Durante a infância, Klee via seu pai como absolutamente autoritário. Em 1902, Klee redescobriu alguns de seus desenhos de criança, feitos entre os 4 e 10 anos de idade. Em 1911, Klee inseriu estes desenhos na parte inicial do catálogo de seus trabalhos, no qual passa a listar meticulosamente toda a sua obra. Com isso, podemos perceber que Klee considera seus desenhos de infância trabalhos independentes e atribui a eles um lugar importante no montante de sua obra.
Estudos da Natureza
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ESTUDOS DA NATUREZA As primeiras tentativas artísticas de Paul Klee se caracterizam pelo desejo da representação naturalista. Durante sua formação escolar regular em Berna, copiava folhas de calendários de pintores suíços ou, durante passeios, registrava impressões da natureza em esboços naturalistas. Klee desenvolveu habilidades de representação do nu artístico ao frequentar, de 1898 a 1901, a escola particular de desenho de Heinrich Knirr, em Munique. De volta a Berna, aprofundou seus conhecimentos do corpo humano em aulas de anatomia, no Instituto de Medicina da Universidade de Berna. O artista considerava insatisfatórias suas primeiras tentativas na pintura a óleo, enxergando nelas não mais que exercícios técnicos.
Invenções
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INVENÇÕES Após uma viagem de formação à Itália, no final de 1901 e início de 1902, Klee retornou à casa dos pais, em Berna, Suíça, para estudos autodidatas. Durante esse período, empenhou-se em desenvolver uma expressão artística própria, oscilando entre estudos da natureza e representações livres de cenas ou personagens de sua imaginação. Entre os anos 1903 e 1905, realizou o que denominou de sua “primeira obra adequada”, composta de uma série de águas-fortes numa linguagem visual própria, que chamou de “Invenções”. A série reflete sua visão cética de mundo e seu desdém pelo código de conduta burguês próprio daqueles anos. Klee observava seus contemporâneos sempre com distanciamento e ironia, questionando os papéis sociais tradicionais, além da própria imagem desses artistas.
Mulher semeando ervas daninhas (Weib Unkraut säend)
Água-forte 18,5 x 11,8 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Mulher semeando ervas daninhas, 1903, 4 Água-forte 18,5 x 11,8 cm Centro Paul Klee, Berna Invenções Entre seu retorno da Itália no verão de 1903 e o ano de 1905, Paul Klee criou em Berna uma série, formalmente concebida, de onze gravuras abordando assuntos complexos. As gravuras refletiam seu envolvimento com diferentes questões sociais que o defrontavam enquanto artista e indivíduo. Em junho de 1903, Klee anotou o seguinte comentário em seu diário: “Até o fim do mês eu estou preparando rascunhos, só para começar, até eventualmente chegar a desenhos adequados. Não que eu pretenda me tornar um especialista. Mas a pintura, com todas as suas falhas, clama por uma trégua com sucessos pequenos. No momento, eu sou um pintor muito cansado mas, de resto, um ilustrador permanentemente capaz. A série de “Invenções” configura um momento de virada no desenvolvimento artístico de Klee. Aqui, pela primeira vez, ele conseguiu formular pensamentos e impressões que o incomodavam pessoalmente. Rascunhos preparatórios, assim como vários estágios e versões de uma cena, mostram que Paul Klee buscava intensamente a forma adequada de se retratar um sujeito. Klee, assim, prestou conta das pressões e dos falsos padrões morais que o haviam perturbado em sua vida até então. Ele descreveu sua visão pessimista de mundo, a ausência de esperança do humano, preso a sua circunstância terrestre. Com ironia e dureza, ele descreveu a desonestidade empobrecida dos rituais sociais, as fantasias sexuais não realizadas e frustrações consequentes, as pessoas ressecadas, mental e fisicamente, com seus corpos distorcidos, frágeis ou mutilados. Em dezembro de 1904 ele escreveu à sua noiva Lily Stumpf em Munique: “...Eu estava feliz que justamente nessa época, diferentemente de qualquer outra, eu podia me ocupar tão intensamente de uma tarefa - na qual avancei bastante, no sentido de criar uma série de figuras - trabalhando por horas até desmaiar. Felizmente, não havia falta de motivação alguma, apenas uma verdadeira exaustão que era sempre aliviada, enfim, pelo mais extenso sono. Portanto, eu espero completar muitos trabalhos de sucesso durante este inverno...” Paul Klee gravou as placas ele mesmo e anotou a fórmula. A impressão ele deixou para a firma de impressão de Berna, de Max Girardet, executar. As 11 Invenções foram exibidas no verão de 1906 na Exibição de Secessão em Munique.
Mulher e animal (Weib u. Tier)
Água-forte 20 x 22,8 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Mulher e animal, 1904, 13 Água forte 20 x 22,8 cm Centro Paul Klee, Berna “Mulher e animal” faz parte de uma pequena série de gravuras que Klee desenvolveu depois de seu retorno de Munique e da Itália para Berna em 1903. A gravura é uma das três primeiras impressões produzidas na série, cada uma mostrando uma figura feminina. Mas o motivo central de “Mulher e animal” continuaria por preocupá-lo ainda por muito tempo. Em “Animal parecido com um Whippet” e “Mulher parecida com uma boneca”, dois desenhos colocados lado a lado num pedaço de cartolina, Klee liga uma mulher a um animal. Esse era um tema popular na arte do século 19, tendo sido também abordado por Kubin. Em uma carta a sua futura esposa Lily, Klee diz sobre a gravura: “A fera é a fera no ser humano (o homem). Ela temporariamente incomoda a mulher com seu farejar indecente. Moral para os debilmente privilegiados: a mulher, que se presume ser fora do comum, porém trazida para uma relação efetiva com um animal, representa algo inteiramente errado, tanto quanto completamente verdadeiro. Propósito: purificação para o ser humano. Bravo.” Com grotesco exagero, Klee apresenta um vira-lata rosnando e uma mulher semi-nua com os braços erguidos em desamparo. No entanto, ao mesmo tempo, ela se vira de costas para o animal, demonstrando assim seu lado instintivo. Klee refere-se criticamente à ideia da mulher como uma criatura nobre, pura. Aqui, ele está mostrando o conflito entre as ideias sociais de moralidade e os instintos humanos. Citação de Klee sobre trabalho "Mulher e animal", 1904 Paul Klee, índice do diário Número 425, 1902 “O nu é um assunto altamente apropriado e eu o tenho estudado progressivamente de todos os ângulos nas sessões de nu no ateliê. No entanto, eu já não quero mais projetar nenhum desses esquemas. Em vez disso, desejo proceder de forma a colocar tudo o que é fundamental. Incluindo o fundamental que é escondido pela perspectiva ótica no plano. E já se capta uma pequena propriedade incontestável. O início de um estilo definido.”
Retratos de Família
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RETRATOS DE FAMÍLIA A autoconsciência de Paul Klee como artista é marcada por uma sequência de cinco autorretratos que o representam em diferentes fases de seu fazer artístico: percepção, ponderação e criação. Antes de sua autonomia como artista, Klee cuidou da casa. Depois do casamento, ele e sua esposa Lily mudaram-se para Munique, onde em 1906 nasceu o único filho do casal, Felix. Enquanto Lily ganhava o sustento da família como professora de piano, Klee tomava conta do pequeno Felix, além de desenhar e pintar na cozinha. É dessa época uma série de retratos dos membros da família, que – por falta de alternativa – eram seus principais modelos.
Artista criando (Formender Künstler)
Lápis sobre papel sobre cartão 27,2 x 19,5 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
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Artista Criando, 1919, 74 Lápis sobre papel sobre cartão 27,2 x 19,5 cm Centro Paul Klee, BernaDoação - Livia Klee Não é nenhuma surpresa que uma série inteira de auto-retratos tenha surgido no trabalho de Paul Klee em 1919. Aos 40 anos, Klee é finalmente um artista conhecido e bem sucedido. Ele teve a oportunidade de exibir seu trabalho e até de vender alguns deles, e tinha um contrato de agência exclusivo com uma galeria em Munique. No mesmo ano, ele se mudou para seu primeiro ateliê de verdade no já bastante dilapidado pequeno castelo de Suresnes em Munique, muito perto de seu apartamento. Esse também foi seu ano mais produtivo até então, e seu filho Felix escreveu: “completamente envolto em seu mundo particular, Klee vivia somente para sua arte, servindo-a desde as primeiras horas do dia até meia noite.” Anteriormente, Klee havia utilizado auto-retratos para se conectar consigo mesmo e, sobretudo, com sua percepção de si mesmo enquanto artista. Por vezes se representava melancólico, outras vezes como um pensador, outras ainda como um artista visionário introvertido. Dentre os trabalhos de número 71 a 74 de 1919 estão quatro auto-retratos desenhados por Klee. Ele está sentado a uma mesa de trabalho; há uma janela atrás dele e as paredes cobertas de pinturas. Klee se retrata como um artista que pensa, sente, reflete, modelando seu trabalho - portanto, durante a preparação para a composição e não, como é geralmente o caso na história da arte, como um artista frente a seu cavalete. Às vezes Klee é facilmente reconhecível, mas os desenhos tendem a ser caricaturas dele mesmo, com um crânio levemente deformado, por exemplo. Em 1905 Klee já havia dito: “Se eu fosse pintar um auto-retrato totalmente verdadeiro, veria-se uma curiosa tigela. Nela, a título de esclarecimento, estaria eu, como o miolo de uma noz.”
Jovem proletário (Junger Proletarier)
Óleo sobre cartão 24,4 x 22,7 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
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Jovem proletário, 1919, 111 Tinta a óleo sobre cartão 24,4 x 22,7 cm Centro Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee Em tons escuros de tinta a óleo sobre cartão, Klee pinta o retrato de um jovem proletário. Toda a pintura é executada com pinceladas poderosas, dinâmicas, que descrevem as formas da figura em vez de retratá-la precisamente. O que é interessante é a coloração do trabalho: o que, à primeira vista, evoca uma atmosfera sombria, examinando mais de perto se nota que é desenvolvido a partir de um sombreado luminoso e colorido, feito com linhas entrecruzadas vermelhas, verdes, amarelas e azuis. Os olhos azuis são particularmente marcantes, mas impressionam também os traços de azul nas orelhas do proletário. O desenho do rosto, do nariz, da boca, dos olhos e das rugas sobre os olhos, cintila com o branco sobre a base sombria da pintura. Parece haver uma luz que recai sobre o lado direito da jaqueta do proletário. Este trabalho é uma das poucas pinturas de Klee na qual ele se engaja diretamente com as condições sociais e políticas de seu tempo. Pouco depois da Primeira Guerra Mundial o Kaiser Alemão renunciou e em abril de 1919 foi declarada a República da Sociedade da Baviera. Klee também se posicionou participando do Comitê de Leilão dos Artistas Revolucionários. Depois da derrota da República Soviética, Klee passou um breve período na Suíça, pois temia ser preso. Com o retrato do jovem proletário, que carrega uma expressão tristonha em seus olhos arregalados, Klee parece estar exprimindo estes acontecimentos. Durante toda sua carreira Klee pintou retratos e abordou a questão da fisionomia humana: na época em frequentou a Escola Particular de Desenho Heinrich Knirr, nas representações cartunescas após seu treinamento em Munique perto da virada do século XIX para o século XX, até chegar a um engajamento ainda mais intenso com a forma na década de 1930. Na maioria dos casos, Klee tenta retratar traços da personalidade, qualidades ou características da figura humana, reduzidas a suas essências.
Caminhos para a Abstração
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CAMINHOS PARA A ABSTRAÇÃO Ao analisar a obra de Wassily Kandinsky, o cubismo e o orfismo de Robert Delaunay, a questão da abstração pictórica tornou-se o tema central para Paul Klee durante os anos 1910. Além da arquitetura, a natureza também servia de modelo para a linguagem da forma abstrata de Klee. Nesse sentido, seu olhar se deslocou do exterior para o interior do objeto. Ele afirmava: “A arte não reproduz o visível, ela torna visível”. Estava convencido de que deveria representar a estrutura e a construção inerentes à natureza e à arquitetura. Inspirado pela estilística do campo de cor de Delaunay, a quem visitou no ateliê parisiense do artista, e a partir da experiência cognitiva vivenciada na viagem à Tunísia em 1914, Klee alcançou a maestria no trabalho com a cor.
Nas casas de St. Germain (In den Häusern v. St. Germain)
Aquarela sobre papel sobre cartão 15,5 x 15,9/16,3 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
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Nas casas de St. Germain, 1914, 110 Aquarela sobre papel sobre cartão 15,5 x 15,9/16,3 cm Centro Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee Jornada à Tunísia A viagem à Tunísia, realizada pelos três amigos Paul Klee, Louis Moilliet e August Macke, em abril de 1914, é considerada um dos grandes marcos da história da arte no século 20. Em grande parte, a viagem em si só aconteceu graças a Louis Moilliet. Ele conhecia Paul Klee desde os tempos da escola e seus caminhos se cruzaram diversas vezes após a infância. Moilliet conhecia a esposa de August Macke, que havia trabalhado na pensão de sua mãe, tendo sido ela que o apresentou a seu marido em sua lua de mel em Berna, em 1909. Moilliet e Macke tornaram-se amigos rapidamente. Finalmente, Louis Moilliet conheceu os Jaeggi em Tunes – doutores de Berna. O casal lhe abriu a casa e, a partir de 1907, Moilliet passou a visitá-los com frequência. Em 1911, Paul Klee e August Macke se encontraram pela primeira vez na casa de Louis Moilliet em Gunten, no Lago de Thun. No período do natal de 1913 em que a família Klee passara em Berna, os três artistas se encontraram em Hilterfingen, onde Macke estava morando. Foi ali que eles planejaram sua viagem para a Tunísia. Aparentemente, a sugestão veio de Klee. Eles tinham problemas financeiros, visto que dependiam do apoio de patrocinadores. Através dos contatos de Moilliet, Paul Klee conseguiu vender 500 francos em quadros para um farmacêutico em Berna. No dia 3 de abril de 1914, Klee chegou em Berna com seu filho Felix, de 6 anos. Como sua esposa, Lily, estava trabalhando profissionalmente e não podia cuidar do menino durante a ausência de Klee, ele foi levado à casa de seus avós. Dois dias depois, Klee e Moilliet saíram de Berna e viajaram de trem até Marselha, onde encontraram Macke. Na noite de 7 de abril, o “Carthage” embarcou numa agitada travessia de 3 horas até o porto de Tunes, onde Klee foi impactado pela luminosidade das cores desde o primeiro momento. Os três passaram os dias seguintes com Jaeggis em Tunes e St. Germaine. No dia 14 de abril eles foram ainda mais longe, até Hammamet, e, no dia seguinte, até Kairouan. Para Klee, Kairouan representava tanto o objetivo quanto o ápice da jornada. As experiências foram tão arrebatadoras, que Klee decidiu retornar a Tunes novamente no dia 17 de abril. No dia 19 ele já estava novamente na Europa, enquanto Macke e Moilliet ficaram na Tunísia por mais alguns dias. No dia 22 de abril, Klee voltou para Berna, vindo de Nápoles. Durante essa viagem, August Macke foi quem mais pintou. Além de cerca de 50 aquarelas, concluiu muitos desenhos. Klee anotou também cerca de 50 itens em seu Catálogo de Obras, incluindo aquarelas, desenhos a lápis e a nanquim. Moilliet parece ter terminado apenas três aquarelas e cinco desenhos. Para Klee, a viagem à Tunísia foi o momento mais decisivo de seu desenvolvimento artístico. Para Macke foram os últimos momentos de sua trajetória: cinco meses depois ele morreu na Primeira Guerra Mundial. Moilliet, por sua vez, retornou em várias ocasiões para o Norte da África.
Composição com janelas (Komposition mit Fenstern)
Óleo e caneta sobre cartão; Moldura original 50,4 x 38,3 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
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Composição com janelas, 1919, 156 Óleo e bico de pena sobre cartão; moldura original 50,4 x 38,3 cm Centro Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee A pintura “Composição com janelas” de 1919 mostra o quanto se aproximam natureza e construção, objeto e abstração, no pensamento e no trabalho de Paul Klee. Por exemplo, em seus escritos Klee fala sobre “arquitetura pictórica”, querendo dizer que uma pintura se organiza de acordo com determinados princípios ordenadores e estruturais, tal qual uma obra arquitetônica. Algumas das estruturas pictóricas de Klee, inclusive, têm sua origem em relações numéricas concretas. Mas as composições pictóricas de Klee estão tão próximas da natureza e da humanidade quanto da arquitetura. “Pinturas”, ele escreveu, “têm seu esqueleto, músculos e pele como seres humanos. Pode-se falar sobre a anatomia da pintura. Uma pintura representando ‘uma pessoa nua’ não deve ser criada baseada nas leis da anatomia humana, mas apenas naquelas da anatomia da composição. Primeiro, se edifica uma armadura na qual a pintura deverá ser elaborada. Até onde se vai para além dessa armadura é uma questão de escolha; a armadura pode ser o ponto de partida para um efeito artístico, mais profundo do que partir apenas da superfície.” Nesta pintura, uma estrutura em forma de grade, parcialmente composta por linhas pretas em ângulos retos, forma uma base. Essa grade de linhas ainda é parcialmente visível sob a camada de tinta que a segue. Em vários estágios do trabalho Klee pintou sobre essa estrutura com manchas de tinta vermelhas, verdes, brancas e pretas, criando um jogo variado de cores e tonalidades diferentes, do claro ao escuro. A isto, Klee sobrepôs formas simples para janelas e plantas, até chegar em cruzes e estrelas e a letra “B”. No verso do quadro Klee anotou “não está a venda; destinado à coleção patrimonial”. Em conformidade com tal anotação, a obra nunca foi comercializada no mercado das artes. Em vez disso, Klee guardou a pintura para si, considerando-a parte da seleção representativa de seu trabalho. Ao mesmo tempo, Klee classificou o trabalho em questão no mais alto nível de sua escala de preço: classe XVIII.
O Mundo como Palco
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O MUNDO COMO PALCO Paul Klee era um apaixonado espectador do teatro – da ópera ao popular teatro de fantoches. Personagens de musicais e de outras peças dramatúrgicas, assim como o palhaço, a marionete ou o acrobata povoavam seu imaginário enigmático. Klee fez constantes associações entre o teatro e a vida. Em suas obras, as representações de personagens como o equilibrista ou o acrobata, por exemplo, com suas arriscadas exibições de equilíbrio e em risco constante, assemelhavam-se à insegurança da própria vida do artista. Como um espectador do teatro, Klee observava as pessoas ao seu redor e comentava os acontecimentos nas suas obras, quase sempre com uma visão irônica e distanciada. Também o filho Felix, que mais tarde viria a se tornar diretor de ópera, brincava e ironizava sobre a vida na Bauhaus. Usando os fantoches criados pelo pai e um palco que ele mesmo construiu na marcenaria, Felix encenava, para amigos e familiares, histórias sobre o cotidiano da escola onde o pai lecionava.
Com a marionete (mit der Marionette)
Óleo e pincel sobre gaze revestida com gesso sobre cartão 37,5 x 32 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
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Com a marionete, 1919, 159 Óleo e pincel sobre gaze revestida com gesso sobre cartão 37,5 x 32 cm Centro Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee Klee e o Teatro Klee era um apreciador de teatro inveterado e verdadeiro devoto de todas as coisas encenadas. Ele adorava a ópera, operetas e peças de teatro tanto quanto as formas artísticas mais modestas, menos rarefeitas, como teatro de fantoches e marionetes, o circo, salas de música e o tipo de teatro popular encontrado em feiras anuais e carnavais. As artes performativas, de maneira geral, a encenação e o mundo de figuras lhe fascinaram sua vida inteira. A conexão que Klee estabelecia entre o teatro e a vida, no entanto, ganhou uma dimensão ainda maior: drama, para ele, não era algo que acontecia exclusivamente nos teatros e lonas de circo – era um elemento muito presente no seu dia-a-dia. O olhar que Klee lançava para o mundo e para a vida era o de um frequentador de teatro. As pessoas ao seu redor eram os atores, os acontecimentos diários, as peças; ele assumiu para si o papel de espectador, observando tudo que acontecia de uma distância segura, como se usasse binóculos de ópera. Pode-se observar que o teatro, em todos os seus aspectos, impregna uma parte substancial do conjunto de obras de Klee. A encenação penetrou inclusive seus autorretratos, e ele experimentou inúmeras formas diferentes de se representar. Seu olhar aguçado para situações teatrais o levou a descobrir traços de encenação humana até no comportamento dos animais. Ele assistia às artimanhas de cães e gatos tentando chamar atenção. Ele chegou até a emoldurar paisagens com cortinas de teatro e retratou plantas como atores em um palco imaginário. Máscaras e personagens fictícios eram fios condutores importantes para Klee e o inspiraram ao longo de sua carreira. O conceito de dualidade no teatro de máscara e nos mecanismos envolvidos no teatro de marionetes eram fonte de crítica mas também de fascínio. Klee também explorou em seus trabalhos o teatro experimental modernista da Bauhaus em Weimar e Dessau. Sabemos que ele era reticente com relação ao que chamava de “espetáculos secos e reduzidos”, mas isso não o impediu de integrar uma série de elementos de sua linguagem visual ao seu próprio trabalho. O circo, com seus números de animais e palhaços, mas principalmente os acrobatas e artistas aéreos, o cativavam especialmente. Ele os via como espelhos de sua própria existência enquanto artista. Acima de tudo, ele tinha os equilibristas como fonte eterna de inspiração – seu exercício de equilíbrio sobre a corda bamba era, para ele, a metáfora do artista que arrisca tudo entre sucesso e fracasso, triunfo e catástrofe. Frequentemente, Klee também apresentava personagens cômicos dos universos da ópera, do cinema ou da rua – seu repertório incluía Falstaff, Chaplin, Arlequim e o Palhaço. Seus bobos são muitas vezes vistos oscilando entre comédia e solenidade, ou são representados desafiando os clichés de seus papéis tradicionais.
Equilibrista (Seiltänzer)
Litogravura 43,2 x 26,8 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Equilibrista, 1923, 121 Litogravura 43,2 x 26,8 cm Centro Paul Klee, Berna Um pequeno acrobata se equilibra nas alturas sobre uma corda. A estrutura na qual a corda está amarrada parece muito precária. Qualquer mudança de tensão seria suficiente para a corda balançar, colocando o pequeno acrobata em perigo. A situação, certamente, pode ser interpretada do ponto de vista autobiográfico, no qual reconhecemos Paul Klee como o equilibrista e na estrutura inconsistente as relações de poder na Bauhaus. A orientação artística e idealista da Bauhaus foi caracterizada por conflitos e estruturas de poder flutuantes. A estrutura geométrica da frágil moldura pode ser interpretada como a influência dos construtivistas - o rosto em perfil como uma influência de Oskar Schlemmer, semelhante à logomarca da Bauhaus criada por ele. E acima de todos esses conflitos está o artista Paul Klee, que não quer envolver nem a si mesmo nem a sua arte, mas acaba tendo que se reorientar constantemente e encontrar o equilíbrio entre as forças dominantes. A cruz, levemente inclinada para a esquerda, ao fundo, sublinha a fragilidade de sua situação. Klee descreveu seu "Equilibrista" como “a mais extrema realização do símbolo do equilíbrio entre forças”. O acrobata na corda bamba adquire seu equilíbrio utilizando uma vara de estabilidade. Klee destacou isso em sua “Morfologia Pictórica”: “A sensação da verticalidade está viva em todos nós, e para não cairmos, ou quando necessário, abrimos os braços de modo a corrigir e equalizar o problema. Em circunstâncias especiais, os estendemos horizontalmente, assim como faz o equilibrista com a vara estabilizadora.” Através do perfil de uma cabeça humana, que pode ser avistado no meio da frágil construção, Klee torna claro seu entendimento do equilíbrio não apenas como um caminhar físico na corda bamba, mas também psíquico. Da mesma fase desta obra, desenhos, aquarelas e pinturas a óleo sem cor foram preservadas. Klee também reproduziu a pintura em litografia.
Gênios - Personagens de um balé (Genien - Figuren aus einem Ballett)
Bico de pena, aquarela e lápis sobre papel sobre cartão 24 x 16,4/15,9 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Gênios (Personagens de um Balé ), 1922, 122 Bico de pena, aquarela e lápis em papel sobre papel sobre cartão 24 x 16,4/15,9 cm Centro Paul Klee, Berna A palavra “Gênio” citada por Paul Klee no título do trabalho se refere aos espíritos protetores na antiga religião Romana. Em cada homem - e apenas em homens - habita um gênio que morre com ele. O gênio representa a personalidade e a capacidade de procriar. Isso também dá origem à palavra “gênio”, que usamos hoje em dia em referência à força criativa, à fonte de inspiração ou a uma pessoa especialmente dotada. As duas figuras na aquarela Gênios (Figuras de um Ballet), pintada em 1922, são facilmente reconhecíveis como duas bailarinas. A forma das pernas e os braços alongados, quase como asas, não deixam dúvida. Também cabe observar a composição magistral destas figuras: a maior, possui olhos azuis radiantes, um tronco encantador e sapatinhos ágeis; a menor veste uma saia branca e o formato de seu rosto lembra uma clave de sol. Mas Klee não retrata simplesmente duas bailarinas em movimento. Na verdade, ele tenta utilizar todos os outros meios a seu dispor, como linha, forma e cor, para acentuar o dinamismo da cena. O contorno das formas das duas figuras se repete como um eco, como se vários momentos diferentes de um movimento estivessem sendo capturados - o que era muito utilizado no futurismo Italiano. Ao mesmo tempo, Klee transforma a cor inicial, tornando os tons mais escuros conforme se aproxima das bordas da pintura. Ele também retoma o sombreamento das tonalidades de cor no contorno das formas na borda inferior do quadro. Aqui, a coloração varia de tons mais escuros na parte de cima a uma cor quase branca bem na parte de baixo. Como resultado, Klee cria uma impressão de espacialidade e simula uma cena sobre um palco, no qual as bailarinas estão intensamente iluminadas por refletores, enquanto o fundo continua na escuridão.
Réplica do fantoche (Replik der Handpuppe)
Réplica do fantoche - Autorretrato fantoche 37 x 23 x 14 cm Zentrum Paul Klee, Berna Réplica do fantoche - Palhaço orelhudo fantoche 48,5 x 17 x 13,2 cm Zentrum Paul Klee, Berna Réplica do fantoche - Espantalho fantasma fantoche 44 x 15 x 11 cm Zentrum Paul Klee, Berna Réplica do fantoche - Poeta coroado fantoche 36 x 17 x 13 cm Zentrum Paul Klee, Berna Réplica do fantoche - Fantasma elétrico fantoche 36 x 15 x 9 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Réplica do fantoche "Espantalho fantasma" Fantoche 44 x 15 x 11 cm Réplica do fantoche "Fantasma elétrico" Fantoche 36 x 15 x 9 cm Réplica do fantoche "Palhaço orelhudo" Fantoche 48,5 x 17 x 13,2 cm Réplica do fantoche "Poeta coroado" Fantoche 36 x 17 x 13 cm Réplica do fantoche “Autorretrato” Fantoche 37 x 23 x 14 cm Centro Paul Klee, Berna O General dos Fantoches Entre 1916 e 1925, Paul Klee fez fantoches para seu filho Felix a partir de materiais diversos. Ao todo, cerca de 50 fantoches foram produzidos, dos quais 30 foram preservados. Paul Klee os fez como brinquedos para seu filho e eles sempre permaneceram na posse da família, nunca tendo sido vendidos nem registrados pelo artista em seu catálogo de obras manuscrito. Os fantoches são produtos híbridos, elaborados como artesanato e brinquedos. Para a realização das cabeças e figurinos, Klee inicialmente se limitou a gesso e retalhos de tecidos, encontrados na cesta de costura de sua esposa. Com o passar do tempo, no entanto, ele passou a utilizar todo materiasi diversos, como tecidos de algodão de diferentes estampas, linho, seda, veludo, bombazina e couro. Para as cabeças, ele usou ossos de vaca e cascas de noz, pele de coelho, fios de cabelo verdadeiros, caixas de fósforo e até uma tomada elétrica. Via de regra, o próprio Klee costurava as roupas - apenas o primeiro figurino foi costurado por Sasha von Sinner - criadora das atualmente renomadas “Bonecas Sasha”. O primeiro cenário consistia num conjunto de ilustrações que Klee havia tirado do almanaque “Der Blaue Reiter” ("O Cavaleiro Azul”). O teatro, feito a partir de porta-retratos antigos e pedaços de pano, ficava junto com os cenários de fundo e decorações de palco em Weimar. Os fantoches foram feitos em diversos grupos. A primeira leva, contendo presumidamente 8 figuras, Felix ganhou no seu aniversário de 9 anos, no dia 30 de novembro de 1916. Aparentemente, essas figuras compunham o elenco do clássico teatro da feira de diversões: Punch, Judy, o diabo, o crocodilo e o policial. Infelizmente, apenas um destes foi preservado. No ano de 1919 veio o segundo conjunto de bonecos, após um intervalo causado pela guerra. A partir de então, mais figuras novas eram adicionadas a cada ano. Atualmente, os fantoches são considerados objetos da história da arte e estão sob a guarda do museu, onde são preservados e incluídos entre objetos de interesse acadêmico. No entanto, não se deve esquecer que eles não foram concebidos como obras de arte para um grande público. “Me segurando na barra do casaco do meu pai, eu - Felix - o acompanhava em todos os seus compromissos. Muitas vezes se tratava apenas de fazer compras ou outros passeios, como pelo Jardim Inglês (English Garden) ou, duas vezes ao ano, pela feira de Auer Dult. Enquanto se encarregava de tais compras, ele me conduzia ao teatro de fantoches que acontecia lá. A performance Bávara original despertou em mim um desejo urgente de ter e fazer algo parecido. Esse desejo de infância animou tanto meu pai que, no ano de 1916, ele fez alguns fantoches e construiu um teatro para encená-los.” (Citação de Felix Klee)
Teatro mágico (Zaubertheater)
Bico de pena, pincel e aquarela sobre papel sobre cartão 30,6/31 x 21,2/21,7 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Teatro Mágico, 1923, 25 Bico de pena, pincel e aquarela sobre papel sobre cartão 30,6/31 x 21,2/21,7 cm Centro Paul Klee, Berna Um poderoso feiticeiro evoca em “Teatro Mágico” um mundo de fantasia que é duplamente irreal: enquanto teatro, com sua própria versão da realidade no palco, e enquanto cenas conjuradas por magia. As criaturas vestidas como pessoas não são apenas atores; eles tampouco podem, de maneira alguma, se assemelhar a nossa visão convencional de realidade. É um mundo governado por outras leis da natureza. A gravidade está suspensa, fazendo com que tudo flutue no espaço. Uma criatura peculiar está entrando pela esquerda do palco, marcada por suas orelhas enormes e olhos incongruentes que nos encaram. Seu corpo parece o corpo de um porco, e sua cabeça poderia ser vista como a cabeça de um gato lambendo a própria boca. Estrelas, a lua e um raio acompanham a sua chegada. O centro da composição está ocupado por um personagem cuja forma, a exceção de sua cabeça e de suas mãos, é de difícil identificação. Em vários lugares, seu corpo é coberto por formas e figuras. A maneira como a sua cabeça e a cabeça da figura anteriormente mencionada se interligam é claramente visível. Os olhos deste grande personagem central de “Teatro Mágico” são apenas sugeridos. Somente sua barba e seu nariz podem ser vistos de forma clara, graças ao tom de cinza utilizado. Uma criatura semelhante a um dragão com dentes afiados e uma boca bem aberta pode ser vista mais abaixo, no lado esquerdo. Sua cabeça se encontra de perfil enquanto seu corpo está voltado para o observador. Sobre seu nariz, uma aparição fantástica equilibra uma vara curvada no final da qual há uma roda. Um pequeno homem com os braços erguidos está montado sobre esta vara: ele parece estar conduzindo as ações. Atrás dele há ainda outra figura, com uma cruz sobre o peito - está aprendendo a se equilibrar. Ela também tem os braços para cima e segura em suas mãos um objeto em formato de lágrima e uma outra forma que lembra um barco ou uma flor. A sua direita, um animal de um olho só está de pé sobre uma mesa pequena. Esta é a única figura na pintura que possui um olho humano. Tudo parece estar em movimento nesse desenho, feito a bico de pena e pincel à maneira dos Velhos Mestres. A sensação é de que os elementos da pintura poderiam, a qualquer momento, se transformar em outras figuras. No trabalho de Paul Klee, animais muitas vezes adquirem a forma de plantas, assim como plantas se transformam em aparições animalescas. A fim de elaborar suas próprias criações, Klee explora profundamente a riqueza que a natureza oferece em termos de formas. Assim, em neNhuma de suas obras, é possível classificar ao certo o que são representações explícitas da botânica ou da zoologia. O mundo fantasioso de Paul Klee, em sua variação constante, o coloca no mesmo território ocupado pelo movimento surrealista, que emergiu em Paris na década de 1920. No entanto, ele não quis se juntar ao grupo, que tinha como líder o autoritário André Breton. Klee optou por trilhar seu próprio caminho, permanecendo autônomo e exclusivo em seu universo criativo.
Professor na Bauhaus
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PROFESSOR NA BAUHAUS A partir de 1921, Klee passou a lecionar teoria da forma no curso básico da Bauhaus, em Weimar e, posteriormente, a partir de 1926, em Dessau, ambas na Alemanha. Ele se interessava principalmente por ensinar a seus alunos uma “configuração viva”. Nos primeiros semestres, a estratégia escolhida foi a de apontar para os processos naturais de crescimento. Mais tarde, ele usaria esse conhecimento da natureza para trabalhar questões ligadas à geometria. Klee também sabia aproveitar de maneira produtiva a teoria da configuração planimétrica e estereométrica em seu próprio trabalho. Em 1931, surgiram várias séries de desenhos de construções, de linhas geométricas, seguindo modelos que ele montava a partir de varetas, elásticos e fios. Klee produzia até 15 variações de um mesmo modelo. Ele brincava com as formas na medida em que as rebatia, projetava, distorcia ou girava. Em desenhos de caráter construtivista, tratava também de temas narrativos.
Avô dirigível (Lenkbarer Grossvater)
Caneta sobre papel sobre cartão 60,3/ 59,6 x 46,2/ 46,5 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Avô Dirigível, 1930, 252 Bico de pena sobre papel sobre cartão 60,3/59,6 x 46,2/46,5 cm Centro Paul Klee, Berna Klee na Bauhaus Paul Klee, em suas anotações para dar aulas na Bauhaus, se refere extensivamente a vários aspectos do movimento no campo da composição. Em relação a peso, Klee apresenta três regras imutáveis, que ele identifica pelos termos “linha de prumo”, “posição” e “diagonal”. A linha de prumo pode ser vista como um peso num fio, simbolizando o poder da gravidade. O sentido é de cima pra baixo, em direção ao centro da terra. Com “posição” Klee se refere ao resultado da gravidade, uma posição de repouso. A “diagonal” é intermediária, entre a linha de prumo e a posição. A força da gravidade pode inibir o movimento, ou até mesmo trazê-lo à condição de estase. Mas trata-se de um caso especial de estase, de acordo com Klee. Do seu ponto de vista, “O estado usual das coisas no espaço é: o estado de movimento.” Inibição e estase são apenas uma ilusão, ocasionada pela ação simultânea de dois corpos. A preocupação de Klee com o movimento tem pouco a ver com a dos futuristas. Em suas anotações ele se refere à teoria da metamorfose de Goethe que diz, por exemplo: “Na natureza há um viver eterno, transformação e movimento; no entanto, a natureza em si não se move: ela se transforma perpetuamente, nunca repousando.” O movimento é um princípio fundamental no pensamento, nas reflexões sobre composição e no trabalho artístico de Klee. A composição se inicia, por exemplo, assim que é desencadeado o movimento de um ponto, produzindo uma linha que se desenvolve, tornando-se forma. Temas como peso, fardo e gravidade são recorrentes no trabalho de Klee. Klee contrasta o vínculo do corpo com a gravidade com uma espiritualidade livre e independência intelectual.
Harmonia da flora setentrional (Harmonie der nördlichen Flora)
Óleo sobre cartão revestido sobre compensado; Moldura original 41x 66/66,5 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
Paul Klee

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Harmonia da Flora Setentrional, 1927, 144 Óleo sobre cartão revestido sobre compensado; moldura original 41 x 66/66,5 cm Centro Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee A pintura a óleo “Harmonia da flora setentrional” pertence ao conjunto que hoje conhecemos como “quadrados mágicos” no qual Paul Klee trabalhou na Bauhaus, em Weimar, e, então, sistematizou durante seu tempo em Dessau, de 1925 em diante. Mais de 10 anos antes disso, ele havia composto suas primeiras aquarelas usando elementos quadrados coloridos arranjados geometricamente. Os “quadrados mágicos” são testemunhos dos estudos metódicos de Klee sobre teoria da cor, nos quais ele investiga, por exemplo, a relação complementar do círculo de cor e da esfera de cor, e seus contrastes de coloração. O artista holandês do De Stijl (“O Estilo”), Theo van Doesburg, que ministrou cursos em Weimar entre 1922 e 1923, proporcionou um importante estímulo para o interesse cada vez mais profundo, manifestado por Klee e outros artistas da Bauhaus, acerca da análise das cores como meio pictórico de produção. A cor primária amarela domina a grade retangular de “Harmonia da flora do setentrional”, enquanto o vermelho aparece apenas como mistura; azul, a terceira cor primária, não aparece. Contrastando com as cores primárias, as cores complementares laranja, verde e roxo estão plenamente representadas. O roxo - como complemento ao amarelo - mostrando a maior variação. Os tons vão esfriando, tornando-se mais acinzentados conforme se aproximam das bordas da pintura - um processo que para Klee, nesta obra, está relacionado com o experienciar da natureza a partir dos sentidos.
O passo (Der Schritt)
Óleo e lápis sobre juta 71 x 55,5 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
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O Passo, 1932, 319 Óleo e lápis sobre juta 71 x 55,5 cm Centro Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee Nas anotações que fazia para planejar suas aulas na Bauhaus, Paul Klee fala sobre liberdade de pensamento. A mente não está sozinha no mundo, como aponta Klee, mas presa a um corpo. Este, por sua vez, está, devido à gravidade, preso à terra. O corpo não possui as mesmas possibilidades de movimento que a mente. Para rastejar, caminhar, subir degraus ou até mesmo pular, ele se mantém sujeito às leis da gravidade - à linha de prumo, nas palavras de Klee. O que Klee analisa teoricamente em detalhe em suas anotações com relação ao movimento, ele procura colocar em prática com suas pinturas - muitas vezes de forma livre e lúdica. Ele busca em termos visuais, na representação, a experiência física da postura corporal ao andar, o ritmo do caminhar ou a busca por equilíbrio. Até em seu título, a obra “O Passo”, de 1932, se refere à movimentação do corpo. A representação é tão clara e simplificada quanto o título: uma figura geométrica em formato de cruz com dois círculos pretos no lugar de olhos e linhas curtas no lugar de pernas; uma longa linha vermelha atravessa a pintura. Klee mostra o movimento e a direção do movimento de maneira muito simples através da postura física, do direcionamento do olhar e do alinhamento dos pés. No entanto, detalhes quase imperceptíveis reforçam ainda mais a impressão de movimento: Klee pinta o braço direito e o triângulo perto da perna direita maiores do que os planos correspondentes na parte esquerda. Isso traz peso para a pintura no sentido do movimento, o que a figura compensa com a postura de suas costas. Klee reduz o aspecto desajeitado e monumental da figura - seu peso - ao colocá-la erguida sobre pernas finas e pequenas. Ele também se utiliza da forma plana desenhada no meio, sobre o corpo da figura, para torná-la mais leve. Em suas anotações, Klee emprega a expressão “levepesado”, o que claramente demonstra sua tendência a fazer uso de elementos contrastantes, como faz na pintura “O Passo”. Finalmente, a linha vermelha representa uma espécie de raio. Klee se utiliza repetidamente da seta ou do raio como símbolo de dinamismo. Nesta pintura também o raio deve ser visto menos como motivo e mais como expressão de movimento.
Desenhando a Realidade
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DESENHANDO A REALIDADE A Alemanha passava por drásticas transformações com a ascensão ao poder dos nacional-socialistas. Em 1931, quando Klee trocou a Bauhaus pela Academia de Artes de Düsseldorf, ele comentava sobre a realidade política em cartas para a esposa. Detestava Hitler, sua demagogia primitiva e a avidez populista pelo poder. A “revolução nacional-socialista” foi por ele comentada com um traço enérgico, numa série de 250 desenhos figurativos a lápis. Encontramos poucas referências diretas ao nacional-socialismo nos títulos das ilustrações de 1932 e 1933. Mesmo assim, Klee fazia alusões à atmosfera violenta e ameaçadora, que no Natal de 1933 o obrigou a emigrar para a Suíça.
Riscado da lista (Von der Liste gestrichen)
Óleo sobre papel sobre cartão 31,5 x 24 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
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Riscado da Lista, 1933, 424 Tinta a óleo sobre papel sobre cartão 31,5 x 24 cm Centro Paul Klee, Berna, Doação de Livia Klee A pintura “Riscado da Lista” é um auto-retrato em cores escuras que mostra Paul Klee de olhos e boca bem fechados, os cantos da boca voltados para baixo. Sobre isto, um grande X foi desenhado com duas pinceladas grossas - sinal inconfundível do ato de dispensa, e dos sentimentos de exclusão e negação. O rosto reduzido a áreas esquemáticas de cor cria o efeito de estar congelado, e a marca da cruz preta sugere um carimbo de censura e destruição. O conteúdo da pintura corresponde ao seu efeito no que diz respeito à aparência crua e rudimentar da tinta desbotada, aparentemente traçada sobre o papel displicentemente. Este auto-retrato foi uma de suas últimas pinturas feitas na Alemanha, imediatamente antes de Klee emigrar para a Suíça. Paul Klee retornou a Berna, cidade de sua infância e juventude, no dia 23 de dezembro de 1933. Isto, no entanto, não aconteceu por vontade própria, mas foi uma reação à ascensão ao poder pelo partido Nacional-Socialista na Alemanha. Desde o princípio, Paul e Lily Klee observavam os acontecimentos políticos na Alemanha com apreensão. Em Weimar e Dessau, eles foram vivenciaram as mais contundentes críticas e perseguições à Bauhaus pelos Nacional-Socialistas. Na primavera de 1933, Paul Klee foi alvo de ataques pessoais: no dia primeiro de abril, a “Voz do Povo de Düsseldorf”, jornal oficial dos Nacional-Socialistas, se posicionou contra a liberal Academia de Arte do Estado e focou seus insultos em Klee. “E então vem o grande Klee, já renomado enquanto professor na Bauhaus, em Dessau. Ele conta para todo mundo que tem sangue Árabe, quando, na verdade, é um típico Judeu Galego.” No dia 21 de abril, Klee recebeu licença compulsória imediata, sendo assim afastado de todos os seus afazeres como professor na Academia. No outono, seria demitido em definitivo, com os seguintes argumentos: “O Professor Klee é considerado Judeu e, enquanto professor, inaceitável e desnecessário.” Na década de 1920 Paul Klee já havia se deparado com alguma rejeição advinda de círculos conservadores no que se referia a sua arte. A declaração de que Klee era Judeu era falsa, mas oferecia ao novo regime, naquele momento, a oportunidade de difamá-lo, arruinando-o financeira e artisticamente. Depois de seu afastamento, Klee voltou-se cada vez mais para seu próprio trabalho, de modo que, apenas naquele ano, com 482 trabalhos criados, acabou produzindo mais do que nos anos anteriores. Em muitos dos trabalhos, Klee analisou os eventos em seu entorno imediato e retratou seus medos e decepções. Um dos conjuntos de trabalhos consistia em mais de 200 rascunhos sobre temas como formação, autoridade, militarismo, humilhação, fuga e inconsciência. Além destes, pinturas predominantemente sinistras foram criadas, como comentários sobre a turbulência política na Alemanha.
Anjos e outras criaturas
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ANJOS E OUTRAS CRIATURAS Em seus mundos imagéticos representados em múltiplas camadas, Klee combinava diversas esferas de realidade e abstração. Dessa maneira, ele ampliava o seu imaginário, abrigando também os mais diferentes tipos de criaturas. Desde 1920, o tema “anjo” – com figuras celestes aladas, de formas antropomórficas -- apareceu repetidas vezes em sua obra. O anjo mais famoso é Angelus Novus, de 1920, adquirido pelo filósofo Walter Benjamin, que o descreveu como o “anjo da história”, que olha assustado para a catástrofe do passado. A partir de 1938, Klee criou uma série avulsa de mais de 40 representações de anjos. Neles, o artista sobrepunha traços humanos e sobre-humanos, definindo-os nos títulos como inacabados, feios ou esquecidos. Nesse campo de transição existencial entre o humano e o sobrenatural, o estado angelical pleno ainda não havia sido alcançado.
Anjo esquecido (Vergesslicher Engel)
Lápis sobre papel sobre cartão 29,5 x 21 cm Zentrum Paul Klee, Berna
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Anjo Esquecido, 1939, 880 Lápis em papel sobre cartão 29,5 x 21 cm Centro Paul Klee, Berna Paul Klee desenhou este “Anjo esquecido”, em 1939, com pouquíssimos traços, feitos a lápis. Esta é uma de mais de 35 representações de anjos feitas nos últimos anos de vida do artista. Na aparência, estes correspondem plenamente ao nosso ideário tradicional de anjos como criaturas gentis e aladas. Mesmo com o artista reduzindo as asas a formas que se estreitam até virarem pontos e, por vezes, tornando feias as criaturas. Todavia, os anjos de Klee não são figuras de luz ou criaturas Cristãs celestiais, como aquelas conhecidas pela história da arte há centenas, senão milhares, de anos. Seus anjos estão muito mais próximos de nós do que em uma esfera celestial, em algum lugar pertencente a um mundo intermediário. Eles se tornaram humanos, e Klee tende a usá-los para se referir ao estado de espírito, características e qualidades humanas. Klee aborda nossos aspectos positivos tanto quanto nossas falhas. Muitas vezes, há nos anjos algo de infantil e inocente. Eles não estão exatamente completos ou ainda se encontram em formação. Klee não determina em que resultaria tal formação e desenvolvimento. Em sua “Teoria da Composição”, Klee diz em determinado momento: “O Homem não é completo. É preciso continuar a se desenvolver, estar aberto, ser uma criança também na vida, uma criança da criação, do criador.” O “Anjo esquecido” é um dos anjos mais expressivos e mágicos da obra de Klee. Ele desenha o rosto do anjo com três linhas: seus olhos, fechados ou voltados para baixo, e sua boca pequena. Não é preciso mais nada para que Klee dê ao anjo sua expressão delicada e gentil. Suas mãos estão juntas e retraídas, como se ele as esfregasse uma na outra, ligeiramente envergonhado.
Trabalhos Tardios
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TRABALHOS TARDIOS A última fase criativa de Paul Klee foi marcada pelo seu estado de saúde, que se tornava cada vez mais precário. No fim de 1935, Klee foi acometido pela esclerodermia, uma doença autoimune rara, que endurece os tecidos conjuntivos, a pele e, por vezes, também os órgãos internos. Apesar disso, nos seus últimos anos de vida, criou uma obra multifacetada e rica, que se caracteriza por uma libertação impetuosa dos modelos de configuração da forma e da composição. Como resultado, o artista elaborou desenhos utilizando o pincel com uma intensa espontaneidade gestual, com uma linguagem visual arcaica, lembrando em parte pinturas infantis feitas com os dedos. Em relação ao conteúdo desses trabalhos, essa “simplificação” técnica correspondia a um lúdico encantamento com o grotesco.
Sem título "Última natureza-morta" (Ohne Titel "Letztes Stilleben")
Óleo sobre tela 100 x 80,5 cm Zentrum Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee
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Sem título (Última natureza-morta), 1940 Óleo sobre tela 100 x 80,5 cm Centro Paul Klee, Berna Doação de Livia Klee Trabalhos tardios, pós 1937 No final de Fevereiro de 1937, Paul Klee conseguiu finalmente voltar a trabalhar depois do longo intervalo em decorrência de sua doença. Com muita energia e o máximo de concentração, ele recomeçou, formal e quantitativamente. Sua produtividade aumentou continuamente, chegando a seu auge em 1939 com 1254 trabalhos – um recorde absoluto. Suas inseguranças e decepções dos anos passados haviam sido superadas. Apesar de Klee nunca ter comentado sobre sua doença em suas pinturas, seu trabalho depois de 1937 é fundamentalmente diferente de tudo o que havia criado anteriormente. Os tamanhos maiores e a formatação em cores mais vivas, assim como uma linguagem simbólica mais acentuada, caracterizam sua obra tardia. As formas se tornam mais simples e aparecem como figuras fortes a partir de linhas bem definidas, muitas vezes pretas, ou listras combinadas com áreas claras e brilhantes de cor. O interesse de Klee por experimentos técnicos se mantém, podendo ser observado na utilização ocasional de materiais e métodos incomuns. Suas escolhas de materiais gráficos se torna cada vez mais variada. Inúmeras pinturas são criadas sobre materiais porosos como papel de jornal e pano de saco. A situação financeira de Klee era tensa e esses materiais baratos lhe permitiam trabalhar com grandes dimensões. Uma porção significativa do seu trabalho tardio é composta por desenhos. Já não era mais importante para Klee alcançar um refinamento de suas possibilidades técnicas com desenhos delicados. Por razões de saúde ele nem tinha mais condições de fazer isso, uma vez que sua doença havia causado um enrijecimento dos membros e uma enorme redução do seu controle motor fino. Poucas linhas fortes e expressivas eram mais adequadas formalmente para a expressão de seus sentimentos e ideias.