Menu

Acesso às principais seções do Musea

Imagem de capa da exposição

Sebastião Salgado: GOLD – Mina de Ouro Serra Pelada

Guarulhos

SESC Guarulhos

12/11/2019 - 16/02/2020

Idioma do conteúdo

Mapa tátil e orientações de localização na exposição

Sebastião Salgado

Mapa tátil e orientações de localização na exposição

Velocidade do áudio

0:00
0:00

MAPA TÁTIL E ORIENTAÇÕES DE LOCALIZAÇÃO NA EXPOSIÇÃO Olá, seja bem-vinda, seja bem-vindo a Exposição de fotografias de Sebastião Salgado: GOLD – Mina de Ouro Serra Pelada. Não deixe de ouvir este texto antes de entrar na exposição. Você está diante do mapa tátil da exposição, nele você pode se orientar pelo trajeto do piso tátil e identificar os pontos de interesse desta exposição. São eles: o texto institucional do SESC Guarulhos, o texto da curadora da exposição, Lélia Wanick Salgado, uma biografia de Sebastião Salgado e 12 fotos acessíveis através da audiodescrição e da Libras. Seguindo o caminho do piso tátil, ao parar no próximo ponto de interesse, você estará diante dos textos Institucional e curatorial, para ouvir a locução completa destes textos basta apertar o botão do aplicativo “Próxima Obra”. O modo de navegação do aplicativo MUSEA se dá através dos comandos “Próxima Obra” e “Obra Anterior”. Depois de ouvir estes dois primeiros textos da exposição você deve seguir o trajeto do piso tátil. O próximo ponto de interesse, indicado pelo alerta no piso, será uma breve biografia de Sebastião Salgado. Agora, é só seguir o piso tátil até o próximo ponto de interesse e ao chegar lá apertar “Próxima Obra”.

Texto Institucional

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

TEXTO INSTITUCIONAL Um retorno ao presente A trajetória da humanidade está profundamente atrelada ao modo de transformar em cultural aquilo que é convencionado como natural. Tais achados da Natureza se caracterizam como mais ou menos preciosos, tocante sua valia simbólica ou produtiva. Desde sua descoberta, o ouro atrai cobiça para si, tornando-se símbolo de realeza e ostentação. Povoa o imaginário da mitologia grega em contextos de ganância e poder; habita paisagens esotéricas na Idade Média dos alquimistas; é encontrado no Novo Mundo e escoado para a Europa, sustentando empreendimentos mercantilistas; e chega aos dias de hoje capaz de mover montanhas. Na história do Brasil recente, esse metal raro protagoniza um capítulo de números e contornos épicos. O caso da Serra Pelada, circunscrito na década de 80, converte-se em um frenesi acompanhado pela mídia, e se depara com um documento constituído sob o olhar e as lentes de Sebastião Salgado. Em 1986, o fotógrafo visitou a região localizada na Amazônia paraense e, ao longo de um mês, registrou o “formigueiro humano”, em que a profunda depressão, antes colina, havia se transformado. Um aglomerado bruto de músculos, suor e sonhos de prosperidade, constituído por 50.000 garimpeiros, lançados a condições de trabalho extenuantes. Salgado capta uma humanidade em seu itinerário de sobrevivência e luxúria, e descortina um cenário de existências aferroadas pela brutalidade de instintos e ambições. São espectros de um mundo tomado por civilizado, singularizado pela prática do trabalho, e que, constantemente, alterna seu vínculo com a Natureza e com uma agenda ecológica, ora se distanciando ferozmente, ora buscando estreitar seus laços em vista de recuperar um equilíbrio vital para a manutenção de um cenário que se anuncia desarmônico. Ao apresentar Gold – Mina de Ouro Serra Pelada, o Sesc reitera seu compromisso com uma agenda cultural que revela relações entre habitantes e planeta, e que, aliadas a pulsões distintas compõem o temperamento humano e servem como semeadura para terrenos geopolíticos e expressivos. Assim, corrobora com o propósito de exercitar olhares éticos e críticos, sobre acontecimentos fundamentais de uma história recente e que se relaciona intimamente com ambos, presente e futuro, que avistamos diante de nós. Danilo Santos de Miranda – Diretor Regional do Sesc São Paulo Agora, clique no botão do aplicativo “Próxima Obra” para ouvir o texto curatorial.

Texto Curatorial

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

TEXTO CURATORIAL OURO Texto de parede 1: Em 1979, a descoberta acidental de ouro em uma remota encosta de morro no Pará atraiu uma massa de garimpeiros autônomos de todas as partes do país. Logo Serra Pelada, como a mina foi batizada, havia se tornado um imenso buraco de cerca de 200 metros de diâmetro e com a mesma profundidade, onde por volta de 50 mil homens estavam apostando suas vidas pela chance de ficarem ricos. Os primeiros a chegar receberam lotes de 2 x 3 metros para explorar e eles, por sua vez, contrataram peões para fazer o trabalho pesado em turnos. Isso envolvia cavar e juntar a terra em terraços estreitos, e depois carregar morro acima sacos de 40 quilos de terra por declives lamacentos e escadas de madeira íngremes. No topo, a terra recolhida era peneirada em busca do metal precioso sob os olhos vigilantes do proprietário do lote. Os peões, homens de todas as idades, cores e classes sociais, eram unidos apenas pelo sonho do ouro. E se isso significava deixar suas famílias, vender seus pertences e assumir grandes riscos, que assim fosse. Para alguns, valeu a pena, mas muitos voltaram tão pobres quanto no dia em que chegaram lá. Por volta de 1992, com a elevação da água tornando a mineração cada vez mais perigosa, muitos garimpeiros mudaram-se para outras áreas da floresta Amazônica. Hoje Serra Pelada é um lago, com apenas sonhos perdidos escondidos sob sua superfície plácida. Texto de parede 2: A ganância febril que move uma corrida do ouro rapidamente pode se transformar em violência. Surpreendentemente, dada a concentração de homens vivendo em condições estressantes, as brigas entre os mineiros de Serra Pelada eram raras. No entanto, a tensão provinha de seu ódio pela polícia enviada pelo governo do Pará para manter a paz. Os garimpeiros eram cautelosos em desafiá-los, pois apenas a polícia podia portar armas, mas ainda assim os confrontos ocorriam. Mais de uma vez, policiais abusivos foram espancados e arrastados até o posto policial mais próximo para serem denunciados. Em outra ocasião, um policial que atirou em um garimpeiro foi apedrejado quase até a morte por uma multidão. Os mineiros tinham um consolo: a crença de que um dia eles seriam mais ricos que qualquer guarda armada. Texto de parede 3: A grande maioria dos sacos não continha nada além de terra e pedras. Mas quando um filão de ouro era alcançado, gritos de excitação ecoavam por toda a mina. No dia em que a terra dessa descoberta potencialmente rica era transportada para o topo da mina, os carregadores usavam camisas listradas e limpas, de modo que a polícia pudesse visualizar rapidamente qualquer um que tentasse escapar com um carregamento. Uma vez entregues os sacos, cada peão podia pegar um deles aleatoriamente na esperança de que contivesse ouro, sendo o resto mantido pelo proprietário do lote. Então começava o longo ritual de garimpagem do ouro, usando a água para separar terra e seixos. Em toda a parte, homens silenciosos, seus corpos recobertos de lama da cabeça aos pés, curvavam-se sobre aquela tarefa, aguardando atentamente o brilho da esperança. Aos domingos, havia uma pausa: alguns mineiros iam para um culto da igreja evangélica para rezar por boa sorte, outros relaxavam ouvindo um músico viajante com sua sanfona. Siga o piso tátil, no próximo ponto de interesse você estará diante do texto de parede com a Biografia de Sebastião Salgado. Ao chegar neste ponto, clique em “Próxima Obra” para ouvir este texto.

Biografia

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

BIOGRAFIA Sebastião Salgado nasceu em 1944 em Minas Gerais, Brasil, e vive em Paris, França. É casado com Lélia Wanick Salgado. Eles têm dois filhos e dois netos. Formado em economia, Salgado começou sua carreira como fotógrafo profissional em 1973, em Paris, e trabalhou com agências de fotografia – dentre as quais a Magnum Photos – até 1994, quando ele e Lélia Wanick Salgado fundaram a Amazonas Images, dedicada exclusivamente à sua obra. Ele viajou por mais de 100 países para desenvolver seus projetos fotográficos. Além das publicações na imprensa, sua obra foi apresentada em livros como Other Americas [Outras Américas] (1986), Sahel: l’homme en détresse (1986), Sahel: el fin del camino (1988), Workers [Trabalhadores] (1993), Terra (1997), Migrations [Êxodos] e Portraits [Retratos de crianças do êxodo] (2000), Africa (2007), Genesis (2013), The Scent of a Dream [Perfume de sonho] (2015), Kuwait, a desert on fire (2016) e Gold (2019). Todos esses livros foram editados, concebidos e tiveram seu projeto gráfico elaborado por Lélia Wanick Salgado. Exposições itinerantes dessas obras foram, e continuam a ser, apresentadas em museus e galerias por todo o mundo. Em sua maioria, tiveram a curadoria de Lélia Wanick Salgado. Em 2013 foi lançado o livro De ma terre à la Terre [Da minha terra à Terra], um relato sobre a vida e a carreira de Salgado escrito pela jornalista francesa Isabelle Francq. Em 2014, estreou o documentário The Salt of the Earth [O sal da terra], codirigido por Wim Wenders e Juliano Ribeiro Salgado. Selecionado para os mais importantes festivais de cinema, ele recebeu o Prêmio Especial do Festival de Cannes de 2014, na seção “Un certain regard”, bem como o Prêmio César do cinema francês para melhor documentário em 2015, além de uma indicação para o Oscar de melhor documentário (longa-metragem) na 87a Cerimônia do Oscar, no mesmo ano. Salgado está trabalhando atualmente em um projeto fotográfico sobre a Amazônia brasileira e seus habitantes, as comunidades indígenas; seu objetivo é ampliar a conscientização sobre as ameaças que elas enfrentam em consequência da exploração ilegal da madeira, da mineração do ouro, da construção de represas, da criação de gado e do cultivo de soja e, cada vez mais, das mudanças climáticas. Sebastião Salgado é Goodwill Ambassador [Embaixador da Boa Vontade] da Unicef, e, entre outras distinções, foi nomeado membro honorário da Academy of Arts and Sciences nos Estados Unidos. Ele recebeu inúmeros prêmios e honrarias, como o Grand Prix National, Ministério da Cultura, França; o prêmio Príncipe de Asturias de las Artes, Espanha; a Medaglia della Presidenza della Repubblica Italiana, Internacional, Centro de Pesquisa Pio Manzù, Itália. Ele foi nomeado Comendador da Ordem do Rio Branco, no Brasil, e Commandeur de l’Ordre des Arts et des Lettres, Ministério da Cultura, França. Em 2016, Salgado foi eleito membro da Académie des Beaux-Arts do Institut de France, e no mesmo ano, a França o nomeou Chevalier (Cavaleiro) de la Légion d’Honneur. Em 2018, foi condecorado Chevalier de l’Ordre du Mérite Culturel pelo Principado de Mônaco. Nesse ano, foi também eleito Foreign Honorary Member [Membro Honorário Estrangeiro] da American Academy of Arts and Letters, Nova York, Estados Unidos. Desde 1990, Lélia e Sebastião vêm trabalhando juntos na recuperação de parte da Mata Atlântica brasileira, no estado de Minas Gerais. Em 1998, conseguiram tornar essa área uma reserva natural e criaram o Instituto Terra. A missão do Instituto é voltada ao reflorestamento, à conservação e à educação ambiental. Siga o piso tátil para o próximo ponto de interesse. Ao chegar nele, clique novamente em “Próxima Obra” para ouvir a descrição da primeira foto acessível da exposição.

Foto 01

Foto vertical em preto e branco 106 x 159 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 01 Foto vertical em preto e branco de 106 x 159 centímetros Do alto, vemos a cava de Serra Pelada como se fosse um profundo vale entre duas montanhas, mas com seu leito e suas encostas lotadas de homens trabalhando. Na foto em preto e branco estes homens se apresentam como pequenas formas brancas e cinzas em contraste com as escuras cavidades dos barrancos que formam as encostas, à esquerda e à direita da foto. Pelo que é possível identificar mais no primeiro plano da foto, a maioria dos homens usa chapéus ou gorros improvisados, para se protegerem do intenso sol da região. As posições em que eles estão sugerem grande agitação e movimento. É nesta imagem que a figura do formigueiro humano se apresenta com maior intensidade. São milhares de homens ocupando um terreno íngreme, acidentado e completamente enlameado. Centenas deles estão sobre as partes mais escarpadas da encosta, parecendo desafiar a gravidade. Seguindo este vale escavado, o fundo da fotografia vai ficando mais branco e perdendo definição e contraste. Isto confere uma atmosfera enevoada e onírica à imagem, que por sua natureza espantosa já nos remete ao universo dos sonhos, e parece fazer uma alusão, mesmo que remota, às ilustrações do Inferno de Dante. Antes de Serra Pelada ser o maior garimpo a céu aberto do mundo, era um morro de 150 metros de altura. A transformação da montanha neste enorme buraco se deu pelas mãos destes milhares de homens que, dia após dia, alimentados pelo sonho de uma vida melhor, o escavaram com pás e picaretas atrás de uma esperança remota. As fotografias de Sebastião Salgado contribuíram imensamente para a formação do imaginário acerca desse enorme garimpo, que tinha regras próprias e específicas, e era ocupado por milhares de homens, exclusivamente, com um único objetivo: extrair o ouro que havia em uma montanha. Esta foto, tirada em um grande plano geral, mostra a multidão espremida na grande cava de Serra Pelada, e ajudou a consolidar a ideia de um formigueiro humano, termo cunhado pela cobertura midiática da época. Muito do que inspirou o fenômeno de Serra Pelada é proveniente de episódios e mitos da história humana. El Dorado, por exemplo, a cidade mítica totalmente feita de ouro no coração da floresta sul americana, incitou incontáveis exploradores europeus a se aventurarem no novo continente. A motivação da busca pelo El Dorado perdura no imaginário humano e se desdobrou em episódios históricos. Da metade do século XIX até o final do século XX, foram registradas febres e corridas do ouro nos Estados Unidos, Nova Zelândia, Argentina, Chile, África do Sul e Serra Pelada (a mais recente). Todas essas corridas apresentam algumas significativas semelhanças: uma migração súbita e gigantesca de trabalhadores em busca de enriquecimento rápido; a luta por melhores condições de vida que se misturou à ganância cega e aprisionou parte dos trabalhadores que emigraram; a maioria dos garimpeiros não ficaram ricos; os mais bem sucedidos foram os comerciantes, fornecedores e capitalistas que orbitavam as minas; dos poucos homens humildes que foram afortunados com grandes descobertas de ouro, muitos perderam tudo, esbanjando o que ganharam com gastos extravagantes. O intenso trabalho dos milhares de homens retratados aqui revela a intensidade e força desta febre do ouro que ofuscou a razão de uma maioria de desvalidos. Estes homens que moveram montanhas em busca de um sonho. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 02

Foto vertical em preto e branco 90 x 135 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 02 Foto vertical em preto e branco de 90 x 135 centímetros Nesta foto se destacam 3 personagens em primeiro plano. Eles estão à frente de um tanque de água cavado no chão. Um deles é um homem branco de cerca de 30 anos de idade. Ele usa uma touca, veste shorts e uma camiseta toda rasgada. Agachado de cócoras, ele segura uma bateia sobre a água barrenta do tanque e olha para a câmera com uma expressão de dúvida e curiosidade. Sentado ao lado dele, na borda do tanque, está um menino de cerca de 12 anos de idade que veste apenas shorts e está descalço, com um dos pés dentro do tanque e outro apoiado em sua borda. Ele também segura uma batéia com uma das mãos e, com a outra, inspeciona o que há dentro dela. Mal conseguimos ver seu rosto pois sua cabeça está quase dentro da bateia, tamanha atenção que ele dedica ao processo. Em pé, atrás do menino, está um alto homem negro. Ele também está sem camisa e veste shorts, calça tênis, usa uma boina de feltro bem simples e tem um pano jogado sobre o ombro esquerdo. Ele está com as duas mãos na cintura e inclina levemente o tronco à frente, observando com atenção o trabalho do menino. Sobre eles pende uma lâmpada, ligada a um fio que não vemos onde está preso. A lâmpada fica logo acima da cabeça do homem que olha agachado para a câmera com as sobrancelhas arqueadas. Como nos quadrinhos, quando uma lâmpada aparece sobre a cabeça de uma personagem significando que ela teve uma idéia, a lâmpada sobre a cabeça do mineiro, que olha ressabiado para câmera, surge como um elemento de fina ironia. Ao fundo, vemos alguns outros homens caminhando por pequenas elevações de terra que formam as ruas do garimpo. Também há uma placa distante, que não se pode ler, ao lado da qual dois homens conversam e, mais ao fundo, a encosta de uma enorme serra. Sebastião Salgado era afeito a um conceito da fotografia, desenvolvido por Cartier Bresson, chamado de “instante decisivo”. Esse instante decisivo acontece quando elementos visuais, emocionais e simbólicos se unem em estreita harmonia e expressam a essência da situação presenciada pelo fotógrafo. Para alguns fotógrafos, o objetivo da fotografia é registrar esse momento único. Para Cartier Bresson, “Tirar fotografias é segurar a respiração quando todas as faculdades convergem em face da realidade que foge. É nesse momento que dominar uma imagem se torna uma grande alegria física e intelectual.” Nesta fotografia, este instante decisivo surge propiciado pela própria presença do fotógrafo. O olhar desconfiado do homem que mira a câmera cria a atmosfera necessária para a realização da foto. Sua cabeça erguida, as sobrancelhas arqueadas, o olhar arisco, confuso… esses elementos unidos contrastam com as figuras dos outros dois personagens, que ignoram a presença do fotógrafo e parecem estar bastante focados na execução de suas tarefas, principalmente o menino, absorto e demonstrando perícia. Essa diferença na postura dos personagens nos causa a impressão de que o homem que olha para a câmera, tendo sido interrompido por uma força externa que o faz olhar para o mundo à sua volta, possa ter sido assim levado a se questionar sobre o sentido dessa busca incessante. Siga para o próximo ponto de interesse e chegando lá clique em “Próxima Obra”.

Foto 03

Foto horizontal em preto e branco 106 x 159 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 03 Foto horizontal em preto e branco de 106 x 159 centímetros A mina de serra Pelada ficou conhecida como formigueiro humano e foi a maior mina de extração manual do mundo. As fotografias de Sebastião Salgado eternizaram estes personagens e situações com tamanha força e contundência que são estas imagens que se cristalizaram em nosso imaginário, são elas que nos vêm à mente quando pensamos em serra Pelada. No centro da foto há um homem tocando sanfona. Não vemos seu rosto, pois ele some na parte superior da foto. O que se destaca é o seu instrumento musical. Há uma roda de homens em volta dele e também não conseguimos ver os seus rostos, vemos apenas parte de suas pernas e seus pés. O ângulo da fotografia mostra o homem da sanfona de cima, o que nos causa a sensação de fazermos parte da roda que observa o músico. O sanfoneiro está sentado sobre um pequeno banco. À sua frente, entre suas pernas, está uma caixa de madeira com dinheiro, são antigas notas de cruzeiros. No chão ao seu lado há um grande e precário alto-falante. O chão de terra, em volta do sanfoneiro e entre as pernas do homens que o assistem tocar, está salpicado de pontos brancos, que na verdade são dezenas de bitucas de cigarro jogadas no chão. Chama atenção na foto a composição feita por Sebastião Salgado. Além de escolher um ponto de vista que nos coloca como espectadores do sanfoneiro, ele não mostra o rosto de ninguém. A música, no meio da situação precária destes homens, não tem rosto. Os homens são apenas pares de pernas em meio a dezenas de bitucas, com um sanfoneiro, também sem rosto, ao centro. Se pensarmos na estrutura de serra pelada podemos entender melhor a cena apresentada na foto. Dentro do garimpo, que era fortemente controlado pelas forças do estado, não era permitida a presença de mulheres ou crianças. Longe de suas famílias, o cotidiano da maioria destes homens era carregar pesados sacos de terra incessantemente subindo e descendo as perigosas e improvisadas escadas de madeira. Neste registro fotográfico se revela um raro momento de descontração, mas esta diversão também tem um tom precário e improvisado, como quase tudo em Serra Pelada. A maioria dos homens usa chinelos de dedo ou tênis enlameados. Poucos deles vestem calças, a maioria está de bermudas ou shorts. O chão repleto de bitucas acentua essa impressão de desleixo e abandono. Na foto em preto e branco os dedos das mãos do sanfoneiro percorrem as teclas da sanfona. Preso ao instrumento, há um microfone improvisado e a única parte do rosto dele que vemos é a boca, bem próxima ao microfone. Com este recorte, parece se materializar na foto a presença da música que ecoa por entre os mineiros. A foto capta o instante e conseguimos imaginar o movimento presente nos dedos do sanfoneiro, assim como é possível pensar que alguns destes pés batiam no chão no ritmo da música. Outro importante detalhe é a caixa com o dinheiro do sanfoneiro bem ao centro da foto. Ela nos faz lembrar o que move Serra Pelada, o que move esses milhares de homens que foram para um lugar longínquo trabalhar em uma mina em busca de um sonho dourado. Em Serra Pelada tudo gira em torno do dinheiro e a composição de Sebastião Salgado capta magistralmente esse espírito. Mesmo nas horas de descontração, a presença do dinheiro se coloca como lembrança da necessidade de subsistência destes homens e ganha destaque na fotografia. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 04

Foto horizontal em preto e branco 90 x 135 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 04 Foto horizontal em preto e branco de 90 x 135 centímetros Em primeiro plano na foto vemos dois jovens embaixo de uma cobertura de palha sustentada por algumas vigas. Embaixo da cobertura há também uma estrutura feita com sacos de terra empilhados formando uma mureta quadrada de cerca de 3x3 metros e 50 centímetros de altura. Dentro dela está a água na qual os garimpeiros fazem a lavagem da terra em busca de ouro. Essa estrutura era uma espécie de tanque de água, muito comum e feito de formas diversas na época e de acordo com as possibilidades. O instrumento utilizado nessas lavagens era a bateia, um objeto redondo e com o fundo cônico que serve para separar o ouro da terra e de outros metais mais leves. Conforme o mineiro gira esse objeto com água dentro, a terra e os metais mais leves vão saindo com a água e o ouro vai ficando no fundo. Os dois rapazes na foto estão de perfil para nós. Um deles está sentado na beira do tanque de água com uma das pernas dentro do tanque e a outra fora dele. O outro está de pé sobre os sacos empilhados de frente para o jovem sentado. O jovem de pé tem os cabelos curtos, está sem camisa, usa apenas shorts e chinelos de dedo. Ele se curva, com uma das mãos em seu próprio joelho e a outra segurando uma das vigas, e olha de cima e atentamente para a bateia que o menino sentado segura em suas mãos. Este outro, sentado na beira do tanque d’água, tem os cabelos encaracolados, veste uma surrada e suja camiseta, shorts, e calça um tênis enlameado. Com uma das mãos ele segura a bateia e, com a outra, escorre água para dentro dela. Ao fundo, vemos o telhado de palha de alguns barracos, mais alguns sacos de terra, que são quase onipresentes em Serra Pelada. Sobre os sacos passam alguns canos que alimentam os tanques de água. Há ainda uma pequena árvore e, mais ao fundo, podemos ver as encostas de uma serra sem vegetação. Salgado trabalha uma composição com vários planos e bastante profundidade de campo. Isto quer dizer que, no enquadramento escolhido pelo fotógrafo, há elementos próximos à câmera, como, por exemplo, os dois rapazes, e elementos distantes, como a serra ao fundo. Abrindo e fechando o diafragma da lente, quem fotografa pode escolher entre deixar todos os planos nítidos ou apenas um dos planos. Aqui, Salgado trabalhou com uma grande profundidade de campo, o que quer dizer que todos os planos da fotografia estão em foco. Outro aspecto importante é como o fotógrafo utiliza a luz natural em suas fotos, evidenciando as formas e volumes do que fotografa e conferindo certa dramaticidade às suas imagens. Nesta foto, em especial, a luz do sol bate na água do tanque e reflete no rosto dos rapazes. Esse jogo de luz, associado ao fato do dois jovens estarem olhando para o mesmo ponto - a bateia que um deles segura acima da água do tanque -, cria impressão de um momento epifânico, de iluminação simbólica. Apesar de não conseguirmos ver se há ou não ouro dentro da bateia, essa luz que incide em seus rostos de baixo para cima cria a impressão do momento iluminado da descoberta de um tesouro. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 05

Foto horizontal em preto e branco 106 x 159 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 05 Foto horizontal em preto e branco de 106 x 159 centímetros Nesta foto os homens retratados dentro da cava, grande buraco de onde se extraíam os sacos de terra para serem levados para a apuração, se particularizam ao mesmo tempo que se confundem com o todo. Cerca de dez homens estão sobre uma grande pilha de sacos de terra e há outros homens em volta. O que os difere é que os homens que estão em volta usam camisetas molhadas de lama e os mineiros sobre os sacos vestem camisetas limpas com listras pretas e brancas, o que os destaca dos demais. A esquerda dos sacos de terra está a encosta do barranco. Nela estão apoiadas as enormes e precárias escadas de madeira que eram ironicamente chamadas de “adeus mamãe” e levavam os homens às bordas da cava. Ao fundo podemos ver parte desta borda, a cerca de 80 metros de altura, com vários homens na beira deste barranco. Os homens de camiseta listrada, sobre os sacos de terra, estão felizes, entre eles um se destaca com o tronco inclinado à frente e uma expressão de deboche. Eles estão lado a lado. A elevação dos sacos de terra os destaca como se eles estivessem em um palco e as camisetas listradas reforçam essa impressão. Os outros mineiros, ao redor dos sacos e à frente deles, estão com suas camisetas sujas e enlameadas, outros carregam pesados sacos nas costas. Alguns destes homens olham para os que estão em cima dos sacos, outros permanecem indiferentes executando suas tarefas. Apenas um deles olha profundamente para a câmera, ele tem uma expressão séria e que contrasta com a felicidade dos homens sobre os sacos. O listrado da camiseta dos homens, os sacos empilhados, os degraus das escadas encostadas no barranco, feitos de ripas de madeira, as pregas das camisas sujas e molhadas dos outros homens, conferem à imagem um tracejado horizontal que dá a foto uma textura uniforme e acaba fundindo os homens ao seu entorno. Esta fusão amplifica a significação simbólica da imagem. Os mineiros se mesclam ao seu entorno se confundindo com a mina, com os sacos de terra que carregam incessantemente e com os perigosos degraus das escadas. O contraste entre os homens sobre os sacos e os outros não se dá só por conta do uniforme. As camisetas listradas indicam que os homens sobre os sacos acharam ouro, por isso eles vestiam estas camisetas, para que não se confundissem com a multidão e pudessem ser melhor vigiados pelo dono do barranco e pelos guardas federais que controlavam toda região de Serra Pelada. A diferença de ânimo entre os homens de listrado e os demais marca um dos maiores contrastes de Serra Pelada: os que tiveram sorte e os desafortunados. Dos milhares de homens que foram para Serra Pelada atrás de riqueza e melhores condições de vida, uma imensa maioria só encontrou miséria, fome e um trabalho excruciante. O sorriso dos afortunados e a severidade e tristeza dos que os cercam retratam de forma marcante a dura realidade do garimpo de que a sorte nem sempre sorri para todos. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 06

Fotografia em preto e branco na vertical 106 x 159 cm

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 06 Fotografia em preto e branco na vertical. 106 x 159 cm Em primeiro plano, vemos um homem sentado no chão, de costas para a câmera, olhando para o seu lado esquerdo. À frente do homem, preenchendo o fundo da fotografia, uma enorme encosta escavada, extremamente íngreme, de aproximadamente 30 metros de altura. A encosta está repleta de homens, todos também de costas para a fotografia, sobre sete precárias escadas de madeira, subindo com seus pesados sacos de terra e pedra nas costas. A fotografia foi captada de dentro da cava, o enorme buraco onde era realizada a mineração de Serra Pelada, que chegou a atingir cerca de 200 metros de profundidade por 200 metros de largura. Chegava-se à cava e saía-se dela por meio dessas enormes escadas de madeira, ironicamente chamadas de “Adeus-mamãe”, nome que traduzia os riscos diários que os trabalhadores corriam. Cada escada era feita por dois longos troncos de madeira na vertical e diversos troncos menores na horizontal entre eles. Esses milhares de homens subiam e desciam diversas vezes diariamente, sem qualquer equipamento de proteção, em condições sanitárias inadequadas e sob o calor intenso do Pará. O homem sentado em primeiro plano parece estar em um breve momento de descanso. Seus cabelos são curtos e encaracolados. Seus braços, fortes. Sua pele está bastante queimada do sol, o que se nota pela marca em sua coxa direita, revelada pela bermuda que subiu um pouco ao se sentar. Em evidência está sua camiseta sem mangas completamente encharcada, assim como seu corpo, de suor, lama e, possivelmente, como resultado das abundantes chuvas da região. As dobras da camiseta e da bermuda molhadas formam linhas, horizontais, verticais e curvas, que visualmente se assemelham aos finos troncos de madeira que compõem as precárias escadas. Uma das escadas, inclusive, cujo longo eixo vertical ocupa o centro da fotografia, a partir de um jogo de enquadramento, parece sair da cabeça do homem sentado. Essa composição proposital causa a sensação de que a escada é um prolongamento simbólico da espinha dorsal deste trabalhador, e as rugas em sua camiseta quase uma externalização de seu interior – veias e sistema nervoso, todos expostos a esse ambiente insalubre, coberto de poeira, monóxido de ferro e elementos químicos prejudiciais à saúde. Além das diversas doenças resultantes da exposição a esse ambiente de trabalho extenuante, precarizado e perigoso, vários desabamentos ocorreram e muitos trabalhadores morreram soterrados. Os que não morreram ou adoeceram, em sua maioria, passaram a vida nessa desgastante e incansável busca pelo ouro sem nunca realizar o tão ansiado sonho de riqueza. Adotamos, através das lentes do fotógrafo, o ponto de vista de um trabalhador exausto. Não vemos seu rosto, no entanto, assim como o de nenhum desses inúmeros trabalhadores que arriscavam suas vidas a todo instante nessa frenética corrida pelo ouro. Centenas de histórias anônimas, de trabalhadores sonhadores e explorados estão contidas neste registro fotográfico. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 07

Foto horizontal em preto e branco 106 x 159 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 07 Foto horizontal em preto e branco de 106 x 159 centímetros A imagem mostra uma grande porção do vale escavado de Serra Pelada, com suas várias camadas e níveis, porções lisas e outras bastante irregulares, marcações de divisão de terra, e os milhares de homens que ocupavam essas áreas diariamente executando suas diversas funções. A fotografia foi tirada de cima, de um ponto mais alto da encosta. À esquerda e na parte superior da fotografia, vemos a parte natural da encosta da serra, que se tornou a borda da cava. Ela segue consideravelmente lisa em uma diagonal morro abaixo até certo ponto. Neste ponto, uma quebra na horizontal forma um estreito caminho plano onde centenas de homens caminham, em sua maioria formigas carregando seus pesados sacos de terra e pedra sobre os ombros. Desse caminho estreito, outra diagonal segue lisa morro abaixo em direção ao centro da cava - que não vemos, mas que estaria à direita da fotografia, caso ela continuasse. Essa segunda diagonal é menos extensa e dá lugar a um segundo nível plano, mais amplo e menos ocupado, onde estão delimitados, com linhas brancas desenhadas sobre a terra, os novos lotes, chamados de barrancos. Essas linhas formam diversos quadrados lado a lado, como um grande tabuleiro de xadrez. À direita desse nível menos escavado está a porção mais íngreme, irregular e perigosa desse enorme garimpo a céu aberto. Lá, ficavam as enormes e abarrotadas escadas, apelidadas ironicamente de “adeus-mamãe”, que davam acesso ao centro da cava, um enorme buraco que chegou a atingir cerca de 200 metros de profundidade. Não vemos os rostos desse bando de homens aglomerados, que à distância fazem jus ao apelido de formigas, com a exceção de dois homens ao centro, na parte inferior da fotografia. Estes dois, parados de pé sobre um pequeno monte de terra, são os que estão mais próximos do fotógrafo, e os únicos que olham para ele diretamente. A história do início de Serra Pelada conta que uma criança encontrou uma quantidade de 6 gramas de ouro enquanto nadava em um riacho. Mostrou ao seu pai, que mostrou ao dono das terras. Em uma questão de meses a notícia se espalhou e milhares de garimpeiros chegavam a todo tempo para trabalhar na mina. Eram milhares de homens trabalhando incessantemente, em condições muitas vezes análogas à escravidão, colocando suas vidas em risco, movidos pela febre do ouro. A serra era escavada de maneira desenfreada, quadrado por quadrado. Os quadrados pertenciam aos donos da terra, minoria que mais lucrava com toda essa exploração. A mineração desordenada, no entanto, teve, e tem até hoje, um altíssimo preço, pago não só pelos milhares de garimpeiros que morreram ou jamais ficaram ricos, mas pela população como um todo e às gerações futuras, devido ao impacto ambiental. A degradação que ela provoca não é jamais revertida. A migração desses trabalhadores gerava uma demanda por serviços e alimentos que levou à ocupação e ao desmatamento das regiões do entorno da mina. Além disso, para se separar o ouro da lama, era usado mercúrio, que é um metal em estado líquido na temperatura ambiente. Este metal se une ao ouro, formando um amálgama. Em seguida, esse amálgama era esquentado novamente para que restasse apenas o ouro. O mercúrio é altamente tóxico e traz gravíssimas complicações à saúde, afetando o cérebro, o sistema nervoso e os rins. Os vapores de mercúrio e o mercúrio líquido descartado diretamente no solo contaminaram toda a região de Serra Pelada. O maior garimpo a céu aberto do mundo foi uma corrida louca, um sonho de muitos que se realizou para poucos, e que deixa suas marcas até hoje. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 08

Foto horizontal em preto e branco 106 x 159 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 08 Foto horizontal em preto e branco de 106 x 159 centímetros Vemos de costas cerca de uma dezena de homens caminhando na parte de fora da cava, carregando, com seus braços, pesados sacos de terra sobre os ombros. Ao centro da foto, em um movimento contrário, vemos de frente apenas um homem caminhando na direção oposta a dos demais. Ele está sem camisa, veste shorts e calça tênis e em sua cintura está amarrado um saco vazio. Ele tem os braços libertos, o esquerdo pende rente ao corpo, o direito está levemente erguido à frente, dando a impressão de que seus braços, livres do pesado saco, balançam calmamente em sua caminhada. Seus cabelos estão arrepiados e desgrenhados, o que lhe confere um ar selvagem. Os outros homens caminham no sentido oposto por esta via pedregosa e suas formas vão lentamente se diluindo num horizonte incerto e enevoado. O contraste desta fotografia a destaca das demais. Ela tem o fundo todo em um cinza claro formado pela uniforme nuvem de poeira, nos permitindo apenas deduzir que o que está coberto pela densa nuvem é a encosta montanhosa de Serra Pelada. Por sua vez, a dezena de homens que vai se perdendo nesta bruma quase onírica tem uma tonalidade de cinza mais escuro. E o homem que caminha no sentido oposto tem um tom de cinza ainda mais escuro. É como se essa sobreposição de planos destacasse este homem e o colocasse a salvo da nuvem de pó que parece engolir os demais. O anonimato dos homens que carregam os sacos, tragados pela lama e pela poeira, os opõe ainda mais ao homem que caminha sozinho no sentido contrário. Deste solitário desistente podemos divisar o rosto, e ele parece afirmar ainda mais sua identidade neste movimento de oposição, deixando para trás este lugar sem céu nem horizonte, que desaparece encoberto pela densa poeira branca. Mesmo que este homem esteja apenas voltando para carregar mais um saco de terra, na composição proposta por Sebastião Salgado ele parece negar essa existência precária, rejeitando a estrutura perversa que aprisionou estes homens a um trabalho desumano e cruel. A sensação que temos é que ele se opõe à febre que acometeu milhares de homens, a ponto de abandonarem tudo em busca de um sonho remoto. Ao registrar este homem que caminha sozinho se distanciando dos demais, Sebastião Salgado cria o símbolo daquele que resiste ao apelo sedutor do ouro e suas promessas, deixando Serra Pelada para trás. Serra Pelada permanece na memória do país como um episódio marcado por suas proporções colossais, e pelo brutal impacto socioambiental causado na região. Um pedaço desta história está aqui nestas fotografias, eternizadas por Sebastião Salgado. Foram elas que salvaram alguns destes homens do completo esquecimento. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 09

Foto horizontal em preto e branco 90 x 135 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 09 Foto horizontal em preto e branco de 90 x 135 centímetros Vemos o retrato, em primeiro plano, de um menino coberto de lama carregando um saco pesado de terra sobre os ombros. Ao fundo, dezenas de corpos adultos masculinos desfocados, também cobertos de lama e carregando sacos de terra sobre um solo lamacento. A maioria desses homens ao fundo está de costas e em um plano mais baixo, dando a impressão de que o menino está caminhando no sentido contrário sobre um aclive. Uma corda está amarrada a uma ponta do saco que o menino carrega e presa em volta de sua cabeça, ajudando-o a sustentar o enorme peso. Ele é um menino de cabelos curtos que aparenta ter por volta de 13 anos. Podemos ver a definição dos pequenos músculos de seus braços apesar do corpo magro, coberto de lama seca em algumas partes e molhada em outras. Seu braço direito segura a extremidade do saco que não tem corda e seu braço esquerdo, livre, está dobrado à frente de seu peito. Os dedos estão dobrados frouxamente e o polegar está erguido, como em um relaxado e inconsciente sinal de “tudo certo”. Seus lábios também apresentam um quase sorriso, mas seu olhar não está voltado para a câmera. Seu rosto está levemente inclinado para sua direita e seu olhar acompanha a mesma direção, mas parece distante, perdido. O frescor de sua aparência jovem e expressão de contentamento contrastam com a falta de brilho e presença em seu olhar. Apenas uma camiseta enlameada com a gola larga e as mangas cortadas cobrem parcialmente seu peito. A gola avantajada e o corte irregular sugerem uma vestimenta improvisada a partir de uma camiseta de tamanho adulto. Esse “não caber” da camiseta é um símbolo que evidencia o descabido da própria situação de Serra Pelada e, em especial, da condição da infância nesse lugar, diante da natureza brutal do trabalho. O braço do Estado em Serra Pelada exercia um controle rígido por meio do interventor Sebastião Curió. Como uma das primeiras medidas, coronel Curió proibiu a presença de mulheres, crianças e álcool no acampamento. No entanto, como evidencia o retrato do jovem, o conceito de infância era algo relativizado em Serra Pelada. Segundo relatos de garimpeiros, quem conseguisse carregar os pesados sacos de areia e terra era considerado apto ao trabalho. Muitos adolescentes entravam na mina escapando da rígida alfândega do governo federal. Eles eram chamados de furões, e ali permaneciam misturados aos homens adultos. Após adentrar Serra Pelada, o status de infância desses meninos era substituído pelo de garimpeiros e estavam sujeitos à vida dura e desumana do trabalho no garimpo de Serra Pelada. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 10

Foto vertical em preto e branco 90 x 135 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 10 Foto vertical em preto e branco de 90 x 135 centímetros Na fotografia vemos um rapaz descendo um dos barrancos da mina. Com o braço direito, ele se agarra ao farrapo de um dos sacos enterrados na encosta que é bastante íngreme. Ele é magro, tem os cabelos encaracolados, calça um par de tênis baratos que aparentam ser menores do que seus pés. Veste uma camiseta e um short sujos de lama. Na sua cintura está amarrado um saco, o que indica que ele subiu carregando o saco cheio de terra e está descendo para carregá-lo novamente. Ele olha para baixo com cautela e atenção, parecendo calcular precisamente seus passos para que não despenque barranco abaixo. Confia seu equilíbrio ao apoio que faz apenas com braços e pernas, num precário e perigoso exercício de descida. As diversas tonalidades de cinza da fotografia em preto e branco e a valorização da incidência da luz natural sobre o periclitante e improvisado alpinista, confere à imagem uma carga dramática e faz com que a figura do jovem quase se confunda com a do barranco ao fundo. Na parte superior da fotografia também podemos ver as pernas dos homens que sobem o barranco com os pesados sacos de terra nas costas. As diversas tonalidade de cinza evidenciam as pernas musculosas e sujas de lama destes homens, que caminham logo acima da cabeça do rapaz em destaque. Percebemos que, além das famosas e imensas escadas chamadas com deboche de “adeus-mamãe”, os barrancos de Serra Pelada, extremamente perigosos, também eram escalados. Íngremes, molhados e superlotados, eles eram constante motivo de acidentes com os trabalhadores da mina. Como em muitas situações que envolvem grandes riquezas, havia muita disputa em Serra Pelada. Quem detinha o direito de explorar os minérios da região era a empresa, na época estatal, Vale do Rio Doce. Acontece que os milhares de garimpeiros que trabalhavam na mina tinham sua própria estrutura e organização de trabalho, o que impediu a empresa de conseguir trabalhar no local. No ano de 1984, no final da ditadura militar, o governo federal indenizou a empresa em 69 milhões de dólares e decretou que o garimpo só poderia existir por mais três anos ou mais vinte metros de profundidade, o que levaria a profundidade da cava a 190 metros. Isso revoltou os garimpeiros, que alimentavam uma grande expectativa em relação ao ouro que ainda poderia existir nas profundezas inexploradas da mina. Na ânsia de chegar a este ouro, a escavação da mina se tornou ainda mais desenfreada e perigosa. As paredes dos buracos simplesmente desabavam sobre os garimpeiros e muitos perderam suas vidas. Com a chegada da data de fechamento da mina, no ano de 1987, os garimpeiros se organizaram para impedir o fechamento e exigir melhores condições de trabalho. Como forma de protesto, fecharam a Ponte Mista de Marabá, uma ponte importantíssima, pois por ela também passavam os trilhos do trem de ferro que escoava os minérios da região. Em uma ação violentíssima de reintegração de posse a Polícia Militar e o Exército brasileiro encurralaram os garimpeiros sobre a ponte e abriram fogo, forçando muitos a se jogarem dela. O número de mortos e feridos neste incidente é desconhecido até hoje. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 11

Foto horizontal em preto e branco 135 x 202,5 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 11 Foto horizontal em preto e branco de 135 x 202,5 centímetros As fotografias de grandes planos gerais traduzem em imagem a imensidão do que foi Serra Pelada. Nesta foto, vemos do alto a grande cratera que foi escavada manualmente para a extração do ouro em Serra Pelada. Ao escolher que lente utilizar, o fotógrafo também escolhe o que fica dentro e o que fica fora da imagem. A fotografia em questão foi tirada da beira da cava com o uso de uma lente bem aberta, que permite que muitos elementos caibam dentro do quadro. A foto ilustra bem por que Serra Pelada ficou conhecida como formigueiro humano. Nesta imagem é possível ver toda a extensão da cava, com milhares de homens dentro dela. As encostas da cava eram bastante irregulares e talhadas em formas retangulares. Isso se dava por conta da divisão dela em barrancos. No fundo da cava vemos, ao centro, um aglomerado de tubos e canos, responsáveis pela alimentação de água para o garimpo e drenagem da água que surgia dos lençóis freáticos. Na encosta da cava, vemos as gigantes e precárias escadas apelidadas de “adeus-mamãe” sendo escaladas por centenas de homens. Para onde se olha na foto é possível ver homens trabalhando e carregando os sacos de terra. Em um primeiro momento, tendemos a pensar que este formigueiro humano era uma caos, sem regras ou leis. Mas em Serra Pelada, a divisão do trabalho era rigorosamente organizada. Basicamente, a grande mina era dividida em barrancos: pedaços de terra de 2x3 metros - dimensão semelhante à da garagem de um carro. O dono do barranco, chamado de Capitalista, era quem ficava com grande parte do ouro encontrado. Abaixo do dono, vinha o Meia-praça, que comandava o trabalho no barranco e era o único empregado que recebia por comissão, cerca de 5% do que era encontrado. Seguiam na hierarquia, em ordem decrescente, o cavador, o apontador, o apurador e o formiga. Eram estes últimos que faziam o trabalho braçal, a mando do Meia-praça. Os formigas começavam o trabalho cavando até chegar na rocha e transportando sacos de terra revirada para fora da cava. Estes sacos eram, então, contabilizados pelo apontador. O cavador moía as rochas com sua picareta atrás das tão cobiçadas pepitas de ouro. Uma das maiores pepitas de ouro do mundo foi encontrada em serra pelada, ela tinha quase 60 quilos. Além das pepitas, o ouro podia ser encontrado em minúsculos grãos na terra, através de um processo conhecido como lavagem, realizado pelo apurador. Ele escorria a terra levada pelos formigas para fora da cava por uma calha coberta de mercúrio e a substância se unia ao ouro, formando uma liga. Então, ele usava a bateia para separar a liga da terra. Depois, essa liga era esquentada para evaporar o mercúrio e sobrar só o ouro. Era essa evaporação do mercúrio, que logo a voltava a se tornar líquido, que contaminava a mina e os garimpeiros. As dimensões colossais presentes nesta foto retratam de maneira muito fiel o gigantismo da mina Serra Pelada. Desde a descoberta da primeira pepita de ouro, por volta de 1979, estima-se que mais de 100 mil pessoas passaram pela grande mina. A cava chegou a ter cerca de 200 metros de profundidade por 200 metros de diâmetro e calcula-se que foram extraídas de Serra pelada, entre os anos de 1983 a 1992, ano em que a mina foi fechada, aproximadamente 40 toneladas de ouro de maneira oficial e mais 40 quarenta toneladas extraídas por meio de contrabando. Com o fechamento da mina, deixaram de ser bombeadas as águas dos lençóis freáticos e das intensas chuvas que atingem a região. Hoje, a profunda cava de Serra Pelada virou um enorme lago de cerca de 100 metros de profundidade, porém completamente impróprio para qualquer atividade humana, devido à pesada contaminação pelo mercúrio utilizado na mineração. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.

Foto 12

Foto horizontal em preto e branco 90 x 135 centímetros

Sebastião Salgado

Velocidade do áudio

0:00
0:00

FOTO 12 Foto horizontal em preto e branco de 90 x 135 centímetros Em primeiro plano, quatro homens cobertos de lama carregam enfileirados volumosos sacos de terra e pedra sobre os ombros. Em volta da cabeça de cada um deles, passando pela testa, uma corda presa ao pesado saco os ajuda a manter o equilíbrio. O homem à frente dos quatro, em destaque, é o mais velho deles, contrastando com os outros três. Um homem aparentemente idoso, coberto de lama, usando uma camiseta em trapos que deixa quase completamente expostos seu peito e partes de seu abdômen definido. Seus músculos ainda são fortes apesar dos ossos levemente aparentes, de sua barba e bigode com muitos fios brancos, suas marcas de expressão, e das veias saltadas nos braços, que sequer seguram o saco sobre o ombro esquerdo, tamanha experiência com o trabalho. Ele olha diretamente para a câmera, seu olhar firme revelando o misto de cansaço e obstinação de quem dedicou anos à busca pelo ouro em vão, mas ainda não desistiu de encontrar. Os homens que o seguem são jovens, suas camisetas ainda inteiras, mas vemos o rosto apenas do que se encontra diretamente atrás dele. Ele olha para baixo enquanto caminha, segura a corda que passa por sua testa com a mão direita para aliviar a pressão e seu rosto sem marcas demonstra cansaço e preocupação. É evidente sua falta de experiência com a dureza do trabalho em contraste com a do homem idoso à sua frente. Os traços de seu rosto também apresentam certa semelhança com os do homem mais velho. Este, na figura de guia ou líder, também pode ser seu pai, avô, ou algum outro parente, evidenciando o fato de que gerações de famílias inteiras trabalharam em Serra Pelada. A semelhança entre os homens de gerações diferentes também reforça a noção do passar do tempo. Simbolicamente, é quase como se víssemos o mesmo homem antes e depois, concretizando o envelhecer nesse lugar tão áspero, e a desilusão que acompanha esse processo. Ao fundo, vemos a encosta com seus diversos barrancos, sendo explorada por centenas de homens cujos rostos não vemos. Essa imagem de fundo está desfocada, o preto e branco se tornando mais esfumaçado e claro, quase como uma névoa que engole o tempo de vida desses tantos homens. Essa qualidade difere da que se nota nos homens em primeiro plano. Estes nós vemos em um preto e branco mais escuro, com alto contraste, exibindo maior riqueza de detalhes e ressaltando as marcas do tempo em seus corpos e rostos. Como esse homem mais velho, que segue trabalhando incansavelmente, muitos passaram praticamente a vida inteira em Serra Pelada. São vários os relatos de trabalhadores que chegaram muito jovens ao garimpo e não conseguiram se desvincular da busca pelo ouro. Contaminados pela febre do ouro homens na sua maioria de origem pobre, viam no garimpo a única possibilidade de ascensão social. No entanto, a rígida organização do trabalho permitia pouca mobilidade social. Dificilmente um formiga ou cavador seria dono de um barranco. A maioria dos donos de barranco, os capitalistas, ou foram os primeiros a chegar ao garimpo, antes do loteamento, ou eram homens já ricos que compravam lotes em Serra Pelada na intenção de multiplicar o investimento. O capitalista ficava com aproximadamente 60% da riqueza encontrada. Os raros casos de enriquecimento eram de meia-praças, os coordenadores dos trabalhadores, que ganhavam por porcentagem, cerca de 5%. Muitos desses homens bamburravam, ou seja, deram sorte e acharam grandes quantidades de ouro, e re-investiram sua fortuna na própria mina. Na ânsia de multiplicar sua fortuna, acabavam perdendo tudo. Outros, vivem a desilusão de não ter conseguido enriquecer nunca, mas permanecem em Serra Pelada, obcecados pela possibilidade de achar ouro. Siga para o próximo ponto de interesse e clique em “Próxima Obra”.